Milonga do Pajador


Venho do fundo da história que foi escrita por mim
No repicar do clarim da luta emancipatória
Reprisando a trajetória dos velhos tebas guerreiros
De romances galponeiros com legendas e amarguras
De dia bebo lonjuras, de noite apago o luzeiro

Sem nunca ter pouso certo, parador, patrão nem dona
Me estendo sobre a carona o pingo pastando perto
Que a atração do campo aberto não há ninguém que resista
E o pajador nativista que o céu inspira e acalma
A querência dentro da alma e o mundo a perder de vista

E a própria estrela boieira que me guia e me desperta
E quando a saudade aperta a guitarra companheira
Faz da milonga campeira o mundo ficar pequeno
E como contra-veneno da mágoa que me acompanha
Bebo graxa de picanha com salmoura de sereno

As vezes quem nada tem é aquele que melhor vive
Quantas fortunas eu tive sem nunca ter um vintém
Amando e querendo bem sempre no maior empenho
E de nada me abstenho quando a incerteza me assalta
E até mesmo o que me falta, faço de conta que tenho

Pajador que trás de infância esta bárbara tendência
De ir de querência em querência, e andar de estância em estância
Sempre olfateando a distância os mil sonhos que extraviei
Por onde andarão não sei no sem fim do céu e o pasto
Mas hei de encontrar o rastro dos versos que não cantei

Um dia quando eu me for rumbeando a querência eterna
Onde bolearei a perna diante do meu criador
Não chorem ao pajador do velho pago florido
Que há de cantar comovido até o último repuxo
Porque só em nascer gaúcho vale a pena ter nascido.

Composição: Jaime Caetano Braun / Pedro Ortaça