História da música Deixa Isso Pra Lá, clássico de Jair Rodrigues

Jair Rodrigues, um dos principais intérpretes de samba do Brasil, é também considerado como o precursor do rap no país. Isso porque seu maior sucesso, Deixa Isso Pra Lá, já trazia versos declamados antes mesmo do gênero musical surgir.

Lançada em 1964, no LP Vou de Samba com Você, a canção se tornou um hit popular graças a todo o carisma de Jair Rodrigues, que costumava cantá-la fazendo uma coreografia com as mãos muito similar aos gestos dos rappers.

Vem conhecer a história da música Deixa Isso Pra Lá e entender por que ela é considerada revolucionária!

História da música Deixa Isso Pra Lá

Composta por Alberto Paz e Edson Menezes, a música Deixa Isso Pra Lá transformou Jair Rodrigues em um dos maiores nomes do samba no país. O que pouca gente sabe é que a canção foi oferecida primeiro a Wilson Simonal, que recusou a gravação.

Nas mãos de Jair Rodrigues, se tornou um clássico. Isso porque foi ideia dele declamar as rimas iniciais em vez de cantá-las, fazendo com que a música se tornasse o primeiro rap brasileiro.

Essa música foi o primeiro rap do mundo, porque ainda não tinha aquele lance de falar em cima do ritmo, era cantado, e esse samba era considerado um sambalanço, contou o sambista à Rolling Stone.

Quando eu fui para o Festival de Montreux, na Suíça, o Herbert Vianna também estava lá, com os Paralamas do Sucesso. E ele me deu essa informação, de que eu seria o pai do rap.

Eu falei: ‘Eu sou pai do Jairzinho, da Luciana, que diabo de filho que você quer arrumar para mim, rapaz?’ Ele disse: ‘Na verdade, é um ritmo que está surgindo, e o primeiro versador desse lance é você’.

O lançamento de Deixa Isso Pra Lá

No livro Jair Rodrigues – Deixe Que Digam, Que Pensem, Que Falem, de Regina Echeverria, o sambista contou a história de como veio a gravar seu maior sucesso.

Foi no final de 1963, durante uma visita à Rádio Nacional, no Rio de Janeiro, que a música foi mostrada a ele, que gostou e resolveu incorporá-la ao seu repertório.

Ensaiei e todas as vezes que cantava no Stardust fazia o maior sucesso. Disse isso ao Alfredo Borba, produtor do meu primeiro LP, e cantei novamente. E o Borba: ‘Que porcaria é essa? Estou te pedindo um samba e você vem com essa droga?’, relembrou.

No entanto, o produtor cedeu e permitiu que Jair Rodrigues gravasse a canção para o seu LP. Para isso, ele convocou o maestro Portinho, considerado como um dos pais do choro moderno, para a gravação.

A música entrou como a última do disco. No lançamento, Alfredo Borba organizou um coquetel para apresentar o LP aos vendedores da Philips. 

O disco foi tocando, os vendedores ouvindo. Estavam alegres, mas sem sobressaltos, sem muito entusiasmo. Quando chegou a última canção e começou a tocar, os vendedores pararam, prestaram atenção e pediram para tocar novamente, contou o sambista.

O produtor, que detestava a faixa, se recusou a ficar na sala. Mas não teve jeito. Depois de quase dez reproduções, os vendedores insistiram para que Deixa Isso Pra Lá fosse lançada como single, em um compacto próprio.

Quando gravei o Deixa Isso Pra Lá, a maior parte dos críticos escreveu que eu era artista de uma música só. Era preconceito contra mim, eu ficava triste. Não houve precon­ceito racial, o preconceito foi com a minha música, afirmou Rodrigues.

A famosa coreografia com as mãos

Ele também explicou como surgiu o movimento das mãos. De acordo com Rodrigues, a coreografia surgiu enquanto tocava Deixa Isso Pra Lá com Hermeto Pascoal na lendária boate carioca Stardust.

Ao apresentar a canção a Hermeto, o arranjador estranhou os versos falados e rebateu: mas que diabo de música é essa? Não sei acompanhar conversa, não! Mas deu tudo certo: depois da música devidamente apresentada, um casal pediu para que repetissem.

Porém, Hermeto havia esquecido o início. Então Jair Rodrigues começou a cantar e a enfiar os dedos no cabelo dele, que parecia um capacete, e enfiava a mão para cima, outra pra baixo. E o pessoal da plateia começou a repetir o gesto. E assim começou, disse ele.

Mais tarde, o apresentador Hugo Santana convidou Rodrigues para se apresentar no programa Show do Meio-Dia. O cantor repetiu o gesto com as mãos por lá e pegou. Só dava o homem da mãozinha, Jair Rodrigues, em todo o Brasil, comemorou o sambista.

Uma canção revolucionária

Em artigo escrito para a revista Piauí em 2014, Emicida define Deixa Isso Pra Lá como uma música revolucionária para a época. O rapper lembrou uma conversa que teve com Jair Rodrigues, que contou a sobre o episódio com Hermeto Pascoal:

Ele disse que ao mostrá-la para os arranjadores eles falavam que não sabiam ‘arranjar conversa’, em referência à maneira como a música soava, remetendo a um estilo falado de canto e não tão preso à melodia como era praxe na época.

No entanto, este não é o único motivo para que a canção seja considerada como vanguardista. Além de inovadora em sua forma e estilo, a música pode ser encarada como um desabafo sobre o momento político que o país vivia.

Lançada em 1964, ano em que foi instaurado o regime militar no Brasil, a letra mostra o incômodo que artistas, principalmente negros e de camadas populares, causavam e declara: deixa que digam, que pensem, que falem...eu não tô fazendo nada, você também. 

Assim, ainda que Jair Rodrigues tenha assumido uma postura neutra em relação à ditadura, a música representa o desejo dos artistas de não se abalar com as críticas e encontrar maneiras de descontrair, apesar da tensão política e social.

Em seu artigo, Emicida afirma que costuma recorrer ao clássico quando o assunto é conservadorismo:

Sempre recorro de forma bem-humorada a Deixa Isso Pra Lá, como se fosse uma profecia sobre o que estava por vir em nossa trajetória, em conversas com amigos sobre uma espécie de conservadorismo instantâneo que surge quando o tema é rap brasileiro.

Frases de samba

Agora que você conhece a história da música Deixa Isso Pra Lá, que tal relembrar outros clássicos com a nossa seleção de 40 frases de samba para alegrar o seu dia? É só escolher a sua preferida e compartilhar!

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