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O significado de Take Me To Church, do Hozier

Analisando letras · Por Mateus Pereira Silveira

2 de Agosto de 2021, às 15:00

De tempos em tempos, algumas músicas alternativas furam a bolha do mainstream e conquistam paradas e rádios de todo mundo, apresentando um novo artista ao público geral.

Em 2014, essa canção foi Take Me To Church, do cantor irlandês Hozier. 

Hozier
Créditos: Divulgação

Lançada um ano antes, ela mescla diferentes estilos como a do indie/rock, gospel e o folk. Principal single de seu primeiro EP, o hit também foi bastantes elogiado por sua qualidade musical e letra, ganhando a indicação como uma das músicas do ano no Grammy. 

Pelo seu título e sonoridade, Take Me To Church já chegou a ser confundida por alguns como um rock cristão, mas quando analisamos a letra, vemos que a intenção de Hozier foi bem diferente disso, com uma mensagem forte e crítica

Quer saber quais os temas que essa composição aborda? Vem com a gente descobrir o significado de Take Me To Church. 

O significado de Take Me To Church

Por trás de um hit, muitas vezes temos mensagens que exploram diversas interpretações.

Take Me To Church é assim e sua letra e seu clipe permitem abordagens que se complementam, cada uma de sua forma. Vamos conhecer essa música com mais detalhes? 😀

My lover’s got humour (Minha amada tem um humor) 
She’s the giggle at a funeral (Ela é a risadinha no funeral) 
Knows everybody’s disapproval (Ela sabe que todos desaprovam) 
I should’ve worshipped her sooner (Eu devia tê-la venerado mais cedo) 

Primeiro de tudo, é legal perceber que durante toda a música, Hozier usa alegorias e simbolismos que permitem diferentes explicações sobre o que ele fala. 

Por exemplo, logo no começo ele parece estar falando de uma relação amorosa um tanto complicada, que não é bem vista por todo mundo, já que ela é provocante e debochada. 

Naturalmente, achamos que ele está falando de uma mulher, pois o cantor usa palavras femininas para apresentá-la. Mas, olhando o contexto a fundo, notamos que personifica um desejo carnal, uma paixão, um sentimento, e não uma pessoa de carne e osso. 

Pelo título da canção, sabemos que haverá alguma menção à igreja. Por isso, a escolha das palavras ajuda a criar um cenário religioso, de seriedade.

Dessa forma, algumas atitudes, comportamentos e estilos de vida não combinam com aquele espaço, e são tão desconcertantes quanto alguém rindo em um funeral. 

If the heavens ever did speak (Se os céus alguma vez falaram) 
She is the last true mouthpiece (Ela é a última profetisa verdadeira) 
Every Sunday’s getting more bleak (Cada domingo fica mais triste) 
A fresh poison each week (Um novo veneno toda semana) 

Enquanto nos templos todo o respeito e a adoração são dedicados às divindades e santos, o protagonista da canção prefere louvar algo mais terreno e físico, algo que pode ser considerado como profano.

As alegorias religiosas ficam mais presentes em cada verso por meio de frases ácidas poeticamente disfarçadas, e, como nos livros, elas nos transportam para um mundo particular, com cenários e acontecimentos. Nesse caso, para dentro de um culto ou celebração dominical. 

É possível notar o tom de crítica quando o cantor se refere às pregações realizadas por líderes religiosos como desoladoras e tristes. 

Isso acontece porque em algumas vezes ao invés de receberem mensagens consoladoras, elas são expostas a discursos proféticos distorcidos, que estimulam o preconceito e o julgamento alheio, logo pode ser comparado com um veneno para a alma. 

Parece pesado, né? É importante deixar claro isso é uma verdade em todas religiões, mas infelizmente é praticado em meios mais fervorosos. 

We were born sick (Nós nascemos doentes) 
You heard them say it (É o que eles dizem) 
My church offers no absolutions (Minha igreja não oferece absolvições) 
She tells me: Worship in the bedroom (Ela me diz: Louve entre quatro paredes) 
The only heaven I’ll be sent to (O único paraíso para onde serei levado) 
Is when I’m alone with you (Vai ser quando eu estiver sozinho com você) 
I was born sick, but I love it (Eu nasci doente, mas eu amo) 
Command me to be well (Ordene-me para que me cure) 
Amen, amen, amen (Amém, amém, amém) 

Na estrofe seguinte, temos mais pistas dos motivos que levaram Hozier a escrever essa letra: a criação de falas homofóbicas e nocivas que saem de dentro da própria igreja e passam a ser vistos como a única verdade para os fiéis. 

Como a igreja é considerado um lugar sagrado, as atitudes que contrariam os preceitos bíblicos são classificados como pecados.

Mas, nem por isso, as pessoas abandonam seus vícios ou comportamentos que contrariam os princípios religiosos: elas apenas os fazem quando estão em locais seguros, como entre quatro paredes. 

Para determinadas religiões, ter relações sexuais antes do casamento é tratado como uma falha, mas só para as mulheres. Já para as pessoas que se relacionam com companheiros do mesmo sexo, o pecado é visto como algo mais grave e imperdoável 😟

Dentro delas, as pessoas que não se encaixam na cultura heteronormativa são vistas como doentes que precisam ser curados.

Na música, nosso protagonista, apesar de dizer que é “doente” por sua conduta sexual e ter nascido assim, ele se ama e isso realmente não é problema ou pecado algum. 

Mas não é dessa forma que os líderes religiosos enxergam. Eles geralmente apelam para a culpa ou sofrimento de familiares para propor um tratamento alternativo, conhecido popularmente como “Cura Gay”. Chocante né? 

Em Take Me To Church, o personagem da canção finge ceder a esses pedidos e aceita essa proposta, mesmo sabendo que continuará sendo do jeito que é, pois ter uma orientação sexual diferente do padrão não é doença. 

Take me to church (Leve-me para a igreja) 
I’ll worship like a dog at the shrine of your lies (Eu louvarei como um cão no santuário de suas mentiras) 
I’ll tell you my sins so you can sharpen your knife (Vou lhe confessar meus pecados, então você pode afiar a sua faca) 
Offer me that deathless death (Ofereça-me aquela morte imortal) 
Good God, let me give you my life (Bom Deus, deixe-me lhe entregar minha vida) 

Chegamos ao coro, talvez uma das partes mais afiadas e envolve a proposta do artista para a música.

Para Hozier, ser levado para a igreja é como um ritual de santificação, em que ele irá adorar a ideia de um Deus fielmente, mesmo que as mensagens transmitidas sejam distorcidas por desejos terrenos. 

A confissão das falhas, da humanidade, também se configura em um processo doloroso, que permite o julgamento por meio da culpa e dessa forma a única maneira de redenção é.

A dedicação total à religião, deixando de lado todos os amores e prazeres considerados mundanos. 

If I’m a pagan of the good times (Se sou um pagão dos bons tempos) 
My lover’s the sunlight (Minha amante é a luz do sol) 
To keep the goddess on my side (E para manter a deusa ao meu lado) 
She demands a sacrifice (Ela exige um sacrifício) 
To drain the whole sea, get something shiny (Drenar todo o mar, pegar algo brilhante) 

Você pediu mais analogias cristãs? Pois temos. Aqui, ao se auto proclamar como pagão dos novos tempos, Hozier relembra o período em que a Igreja incitava a caça às bruxas e aos hereges, ou seja, aqueles que não seguiam os ideais pregados pela instituição religiosa. 

Hoje, alguns grupos cristãos vêem as relações homoafetivas e as pessoas trans como algo não natural, que precisam de uma reabilitação espiritual.

Essa transformação seria um sacrifício praticamente impossível, tal como secar as águas do mar. Afinal, não se deixa de ser gay ou trans por liberdade de escolha, uma vez que as pessoas nasceram assim 😉 

Something meaty for the main course (Algo carnudo para o prato principal) 
That’s a fine looking high horse (Esse cavalo soberano é bem charmoso) 
What you got in the stable? (O que você tem no estábulo) 
We’ve a lot of starving faithful (Nós temos um monte de fiéis famintos) 
That looks tasty (Isso parece saboroso) 
That looks plenty (Isso parece abundante) 
This is hungry work (Esse trabalho é insaciável) 

Já dissemos que nessa letra contexto é tudo? Ao isolar essas frases, temos diversas abstrações que parecem não fazer sentido. Contudo, dentro da mensagem passada, é possível encontrar dois significados. 

Seguindo pelo lado ácido, notamos que Hozier se refere ao momento de confissão dos pecados ou dos erros como um prato cheio para satisfazer quem acredita cumprir os requisitos da moral e dos bons costumes. 

Isso mostra que minorias ou grupos que não se enquadram aos valores cristãos muitas vezes são submetidos a julgamentos e vistos com maus olhos pela sociedade. 

Em contrapartida, quando canta that looks tasty, that looks planty, o artista acredita que aceitar o prazer do corpo é delicioso e satisfatório, como se preenchesse todo o desejo de amar e de se sentir bem, independente dos seus gostos e hábitos.

No masters or kings when the ritual begins (Nada de mestres ou reis quando o ritual começa) 
There is no sweeter innocence than our gentle sin (Não há inocência mais doce que nosso pecado) 
In the madness and soil of that sad earthly scene (Na loucura e imundície dessa triste cena mundana) 
Only then I am human, only then I am clean (Só então sou humano, só então me torno puro) 
Amen, amen, amen (Amém, Amém, Amém) 

Por fim, vemos que o personagem realmente se entrega aos seus amores e desejos, sem se preocupar com rituais ou rótulos. E indiretamente, joga uma pergunta no ar: se esse pecado nos faz tão bem, por que devo me sentir culpado?

Afinal, todos somos humanos e mantendo a nossa essência, podemos sentir a leveza de viver puros e plenos. 

A importância do clipe de Take Me To Church

A letra de Take Me To Church foi indicada a prêmios pelo seu tom social. No entanto, apenas escutando a música, talvez seu objetivo passe despercebido diante de um vocal tão presente e uma melodia que cativa a atenção. 

Por isso, trazer o tema para o campo visual é importante. E o clipe da canção não deixou dúvidas sobre o que ela queria refletir

Nele, dois homens vivem um relacionamento amoroso enquanto levam sua vida pacata.

No entanto, um morador local enxerga eles com um olhar preconceituoso e reúne um grupo que torna a vida do casal um inferno. 

O desfecho triste e a filmagem em preto e branco trazem mais peso para uma verdade que precisa ser dita: a homofobia mata.

Em entrevista, Hozier explicou que as desilusões com a igreja motivaram a composição do single e que a atitude omissa e condenatória dela deu um aval para que as pessoas agissem de maneira homofóbica

Em sua visão, a música é sobre a possibilidade de expressar sua liberdade sexual e como as instituições religiosas colocam um limite nisso.

Hozier
Créditos: Divulgação

Ele também comentou na época que sua intenção não era fazer um hit comercial, mas o clipe ajudou a popularizar a canção e fazer que ela se tornasse um grande sucesso por todo o mundo. 

Nem tudo é o que parece

Como Take Me To Church, muitas canções parecem ser sobre um assunto por causa do seu ritmo ou pelo título mas acabam nos surpreendendo com seu significado. 

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