Trem Das Cores

Memória, afeto e liberdade em “Trem Das Cores” de Caetano Veloso

Em “Trem Das Cores”, Caetano Veloso constrói uma narrativa sensorial e afetiva a partir de imagens cromáticas e detalhes do cotidiano. A referência à “seda azul do papel que envolve a maçã” remete ao costume de embrulhar maçãs argentinas em papel azul, evocando memórias de infância e um sentimento nostálgico. A música também funciona como uma homenagem discreta a Sônia Braga, com quem Caetano viveu um romance e compartilhou viagens de trem entre São Paulo e Rio de Janeiro. Cada cor e paisagem descrita na letra se transforma em uma lembrança íntima desses momentos.

A letra apresenta uma sucessão de imagens como “a franja da encosta cor de laranja, capim rosa-chá” e “o ouro ainda não bem verde da serra, a prata do trem”, que não apenas criam um quadro visual, mas também sugerem sensações e estados de espírito. O uso de sinestesia em versos como “os átomos todos dançam, madruga, reluz neblina” mistura cores, movimentos e luzes, ampliando a experiência sensorial. Além disso, ao celebrar a diversidade das cores e paisagens, Caetano faz uma sutil oposição à repressão do regime militar, valorizando a liberdade e a pluralidade em contraste com a uniformidade imposta pela época.

Elementos como “crianças cor de romã” e “casas tão verde e rosa” reforçam a riqueza cultural e a pluralidade do Brasil. O verso “azul que é pura memória de algum lugar” mostra como as cores carregam lembranças e afetos. Assim, o “trem das cores” simboliza uma viagem física, emocional e histórica, conectando experiências pessoais, críticas sociais e a celebração da beleza cotidiana.