Odeio

Ambiguidade emocional e protesto em "Odeio" de Caetano Veloso

Em "Odeio", Caetano Veloso transforma o sentimento de ódio em uma extensão do amor ferido, criando uma canção marcada pela ambiguidade emocional. O refrão repetitivo, "odeio você", carrega uma ironia amarga, pois, como destacou Jorge Mautner ao chamar a música de "a mais bela canção de amor", o ódio aqui surge como o outro lado da paixão. A melodia suave contrasta com a dureza da palavra "odeio", intensificando a sensação de conflito interno, especialmente diante do contexto da separação de Caetano e Paula Lavigne, que inspirou a composição.

A letra traz imagens surrealistas, como "veio um golfinho do meio do mar roxo" e "hoje o sol veio vermelho como um rosto", que funcionam como metáforas para o turbilhão emocional do narrador. Esses versos misturam beleza e estranheza para expressar a confusão e o excesso de sentimentos após o fim do relacionamento. O trecho "veio a maior cornucópia de mulheres / todas mucosas pra mim" ironiza a ideia de abundância e desejo, mas revela insatisfação e vazio. Já "veio e não veio quem eu desejaria / se dependesse de mim" explicita a frustração diante do desencontro entre desejo e realidade.

Além do aspecto pessoal, "Odeio" ganhou interpretações políticas em apresentações ao vivo, quando Caetano adaptou o refrão para protestar contra figuras públicas como Michel Temer e durante o impeachment de Dilma Rousseff. Isso mostra como a força direta e ambígua da palavra "odeio" permite que a música seja apropriada em diferentes contextos de insatisfação, ampliando seu significado para além do âmbito íntimo.