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Letra

    Amor,
    Estou triste porque
    Sou o único brasileiro vivo
    Que nunca viu um disco voador.
    Na minha rua todos viram
    E falaram com seus tripulantes
    Na língua misturada de carioca
    E de sinais verdes luminescentes
    Que qualquer um entende, pois não?
    Entraram a bordo (convidados)
    Voaram por aí
    Por ali, por além
    Sem necessidade de passaporte
    E certidão negativa de ir,
    Sem dólares, amor, sem dólares.
    Voltaram cheios de notícias
    E de superioridade.
    Olham-me com desprezo benévolo.
    Sou o pária,
    Aquele que vê apenas caminhão
    Cartaz de cinema, buraco na rua
    & outras evidências pedestres.
    Um amigo que eu tenho
    Todas as semanas vai ver o seu disco
    Na praia de itaipu.
    Este não diz nada para mim,
    De boca, mas o jeito,
    Os olhos! contam de prodígios
    Tornados simples de tão semanais
    Apenas secretos para quem não é
    Capaz de ouvir e de entender um disco.
    Por que a mim, somente a mim
    Recusa-se o ovni?
    Talvez para que a sigla
    De todo não se perca, pois enfim
    Nada existe de mais identificado
    Do que um disco voador hoje presente
    Em são paulo, bahia
    Barra da tijuca e barra mansa.
    (os pastores desta aldeia
    Já me fazem zombaria
    Pois procuro, em vão procuro
    Noite e dia
    O zumbido, a forma, a cor
    De um só disco voador.)
    Bem sei que em toda parte
    Eles circulam: nas praias
    No infinito céu hoje finito
    Até no sítio de um outro amigo em teresópolis.
    Bem sei e sofro
    Com a falta de confiança neste poeta
    Que muita coisa viu extraterrena
    Em sonhos e acordado
    Viu sereias, dragões
    O príncipe das trevas
    A aurora boreal encarnada em mulher
    Os sete arcanjos de congonhas da luz
    E doces almas do outro mundo em procissão.
    Mas o disco, o disco?
    Ele me foge e ri
    De minha busca.

    Um passou bem perto (contam)
    Quase a me roçar. não viu? não vi.
    Dele desceu (parece)
    Um sujeitinho furta-cor gentil
    Puxou-me pelo braço: vamos (ou: plnx),
    Talvez...?
    Isso me garantem meus vizinhos
    E eu, chamado não chamado
    Insensível e cego sem ouvidos
    Deixei passar a minha vez.
    Amor, estou tristinho, estou tristonho
    Por ser o só
    Que nunca viu um disco voador
    Hoje comum na rua do ouvidor.


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