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Xeque-Mate

Edu Krieger

Letra

    Diz aí o que é pior
    Legalizar o aborto
    Ou saber que aquele menor
    Pela mão do sistema também vai ser morto

    Eis aí o xeque-mate
    Legalizar o entorpecente
    Ou saber que o tráfico abate
    A cada minuto mais um inocente

    Quando ela engravidou
    Não tinha a menor condição
    Pois aquele pequeno embrião
    Jamais poderia ganhar seu amor

    Ela então procurou o doutor
    Mas a clínica é clandestina
    A polícia invadiu dando show
    “Você não é mãe, você é assassina”

    E o apresentador
    Do programa da televisão
    Aplaudiu a polícia e gritou
    “Quem faz um aborto é filho do cão”

    O recém-deputado-pastor
    Que foi recorde na votação
    Disse ao povo que Deus dá a vida
    E mãe homicida não ganha perdão

    E nasceu mais um coitado
    Apanhando da mãe todo dia
    E a mulher toda hora dizia
    “Se fosse por mim eu teria abortado”

    O moleque cresceu sem afeto
    Do seu pai nunca teve notícia
    Desprezado desde que era feto
    Com medo da mãe e também da polícia

    Quando fez quatorze anos
    Já sabia o que é ser vida louca
    E fazia um monte de planos
    Queria um dia ser dono da boca

    Quando a guerra sangrenta estourou
    Contra a forte facção rival
    Uma bala perdida encontrou
    Um pacato senhor que olhava o jornal

    Nunca usou droga nenhuma
    Era exemplo de pai de família
    Mas a bala de quem engatilha
    Atinge também quem não cheira nem fuma

    A polícia cercou a favela
    Foi porrada pra tudo que é lado
    Gente de bem que também mora nela
    Acaba pagando por ser favelado

    Quatro mortos, três feridos
    Novo saldo da guerra do pó
    A polícia caçando bandidos
    Às vezes atira sem mira e sem dó

    Mas a bala não é de borracha
    Nem é bomba de efeito moral
    E ainda tem muita gente que acha
    Que nesse país todo mundo é igual

    E aquele adolescente
    Que a mãe não queria gerar
    Exibia o fuzil HK
    E atirava em tudo que via na frente

    De repente foi surpreendido
    Por um tiro calibre 40
    Seu esquálido corpo caído
    Entrou num processo de síncope lenta

    E o apresentador
    Do programa da televisão
    Aplaudiu a polícia e gritou
    “Quem é traficante é filho do cão”

    Quando a mãe chegou perto pra ver
    O desfecho do filho bandido
    Ouviu dele antes de morrer
    “Eu preferia jamais ter nascido”

    Diz aí o que é pior
    Legalizar o aborto
    Ou saber que aquele menor
    Pela mão do sistema também vai ser morto

    Eis aí o xeque-mate
    Legalizar o entorpecente
    Ou saber que o tráfico abate
    A cada minuto mais um inocente


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