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Remorsos De Castrador

Jaime C. Braum

Letra

    Um pealo --- um tombo --- grunhidos
    de impotente rebeldia,
    o sangue da cirurgia
    No laço e no maneador.
    Nada pra tapear a dor
    do potro que --- sem saber,
    perdeu a razão de ser
    na faca do castrador.

    Há um bárbara eficiência
    nessa rude medicina,
    a faca é limpa na crina
    que alvoroçada revoa,
    pouco interessa que doa,
    a dor faz parte da vida.
    Há de sarar em seguida,
    desde guri tem mão boa.

    Aprendeu --- nem sabe como,
    a estancar uma sangria.
    Sem noções de anatomia
    é um cirurgião instintivo
    que --- por vezes --- pensativo,
    afundou na realidade
    da crua barbaridade
    desse ritual primitivo.

    Já faz tempo --- muito tempo,
    que um dia --- na falta doutro,
    castrou seu primeiro potro,
    um zaino negro tapado.
    Que pena vê-lo castrado,
    o entreperna coloreando
    e os olhos recriminando,
    num protesto amargurado.

    Depois do zaino --- um tordilho,
    depois --- baios e gateados,
    um por um sacrificados
    pela faca carneadeira
    e o rude altar da mangueira
    a pedir mais sacrifícios
    dos bravos fletes patrícios,
    titãs de campo e fronteira.

    Por muitos e muitos anos
    andou nos galpões do pampa,
    castrando pingos de estampa
    com renomada experiência,
    cavalos reis de querência,
    parelheiros afamados,
    pela faca condenados
    a morrer sem descendência.

    Às vezes, durante a noite,
    um pesadelo o volteia
    e o remorso paleteia.
    Castrador!... que judiaria!
    E quando sem serventia
    por aí deixar semente
    no mundo onde há tanta gente
    pedindo essa cirurgia.

    E ali está --- defronte ao rancho,
    pastando o mouro do arreio,
    pingo de campo e rodeio
    que castrou --- quando potrilho.
    O mouro --- mesmo que filho
    do xirú velho campeiro,
    o último companheiro
    do seu viver andarilho.

    Na primavera --- outro dia,
    um potranca lazona,
    linda como temporona,
    vestida em pelagem de ouro,
    veio se esfregar no mouro,
    mordiscando pelo e crina,
    mais amorosa que china
    num princípio de namoro!

    E o mouro? --- pobre do mouro!
    Não pode ter namorada.
    Veio, direto à ramada,
    numa agonia sem fim,
    olhando pro dono, assim,
    num bárbaro desespero,
    como dizendo: parceiro,
    vê o que fizeste de mim!!


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