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Os Três Joãos

Jorge Claudemir Soares

Letra

    I
    Eram três "Joãos" diferentes.
    Três destinos amarrados,
    embora, sendo afastados
    pelas convenções sociais.
    Laços de honra e morais
    prendiam as suas vivências;
    eram herdeiros da querência,
    e, não a deixariam jamais.
    II
    "João Ninguém" era andejo,
    que vagava pelo brete,
    conhecia bem os macetes
    de enganar a sua miséria;
    vivia a fazer pilhérias
    da sua sina aragana.
    Ria da existência insana,
    e de não ter ambição séria.
    III
    "João Alguém" o média-classe
    se ajustou como empregado,
    era sempre comandado
    e tinha pouca opinião;
    sua meta era um galpão,
    e um churrasco no braseiro,
    Trabalhava o dia inteiro
    pra enriquecer o patrão.
    IV
    O ricaço, "João Tabém",
    este sim, era entojado;
    andava sempre bem pilchado
    e a guaiaca com dinheiro.
    Metia-se em entreveiros,
    só pra gastar "a la farta",
    ou para arriscar nas cartas
    o lucro do ano inteiro.
    V
    Na grande e falada estância,
    não entrava "João Ninguém".
    Tinha ordem pro "Alguém",
    expulsá-lo da porteira.
    Que fosse pra carreteira
    viver de chuva e de vento;
    que tirasse seu sustento
    da caridade breteira.
    VI
    Quando o sul faz cara feia
    e a necessidade aperta,
    é sempre porteira aberta
    por onde passa a fome,
    se vai a moral de um homem
    quando o couro sente frio,
    e a barriga entra em cio
    quando a boca nunca come.
    VII
    "João Ninguém" fez uma bobagem
    quando o pavor desceu pra faca,
    laçou e carneou uma vaca
    do plantel do "João Tabém".
    Nunca pensou que o "Alguém"
    rondasse a volta do mato,
    e usasse um "Quarenta e quatro"
    para abatê-lo também.
    VIII
    A tragédia estava armada,
    pois, morreu o "João Ninguém".
    A prisão do "João Alguém",
    foi apenas consequência.
    Sumiram dois joãos da querência
    por falta de sensatez,
    o que cada homem fez
    foi buscar sobrevivência.
    IX
    Se o avarento ajustasse
    o "Ninguém" de peão campeiro,
    talvez, dobrasse o dinheiro
    que trazia na guaiaca,
    desgraça que rico ataca
    entre os pobres não se cria,
    e o "Ninguém" nunca seria
    andejo e ladrão de vaca.
    X
    A ganância, cria o monstro
    e faz o mal perpetuar,
    o estancieiro, só fez negar
    uma chance ao teatino,
    selando assim, o destino
    de dois terços da querência
    sem exame de consciência
    ou do ensinamento divino.
    XI
    Que chance teve o Ninguém,
    de escolher o seu caminho?
    Pois, deixaram-lhe sozinho
    sem direito, e sem a lida.
    Negaram-lhe casa, comida,
    o respeito e a hospitalidade,
    que um cidadão de verdade
    reponta por essa vida.
    XII
    João Alguém foi recolhido
    por vender o seu trabalho,
    era apenas um espantalho
    a serviço do estancieiro.
    O Tabém foi o primeiro
    a negar-lhe uma ajuda,
    se a sorte do jogo muda
    se afasta até o coimeiro.
    XIII
    Comparando duas eras:
    da miséria e da escravidão;
    onde o pobre é sem galpão,
    não tem bóia ou dignidade,
    que os escravos na verdade
    tinham feijão e senzala.
    O "Ninguém" ganhou só bala,
    por paga da sociedade.
    IXV
    Desde o princípio do mundo
    que as coisas dão-se assim,
    não se acha nunca o fim
    do caminho da ganância
    e em qualquer circunstância
    quem domina é o joão nobre,
    e obedece o peão pobre
    porque precisa da estância


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