exibições de letras 547

Antônio Conselheiro e as 25 Igrejas

Laécio Beethoven

Letra

    Antonio Conselheiro e as 25 Igrejas
    1
    Mudei em setenta e três
    Pra morar no Maranhão
    Mas eu não tinha a noção
    Do que ia acontecer.
    Logo que disse - prazer!
    Ao primeiro morador
    Ele, espantado, gritou:
    -É Antonio Conselheiro
    Que baixou n'algum terreiro
    E aqui se incorporou!
    2
    Aquilo foi o prenúncio
    Do que viria a seguir,
    Eu tinha chegado ali
    Dessas plagas da Bahia.
    Por não gostar de folia,
    Não dar "valor" a dinheiro,
    Não ir a cabelereiro
    E ser amável no trato,
    Diziam eu ser o retrato
    Do "beato" Conselheiro.
    3
    Quando já era bancário
    A coisa seguiu assim,
    Só referiam a mim
    Como Antonio Coselheiro.
    Aquilo foi um roteiro,
    Um fato a considerar.
    Minha passagem por lá...
    Por lá... pelo Maranhão
    Transformou em obsessão
    E resolvi pesquisar.
    4
    Esse fato me marcou
    Naqueles anos setenta.
    Minha mente tava atenta
    Pro beato singular.
    E procurei me ligar
    Na vida do Conselheiro
    Esse insigne brasileiro
    De Belo Monte - Canudos
    Que foi alvo até de estudos
    Em países do estrangeiro.
    5
    Naquele ano de trinta
    Do século dezenove
    Nasceu em família pobre
    Como Antonio Maciel.
    Seu pai deu graças ao Céu,
    Pegou o filho no braço
    No dia treze de março
    Na Vila Campo Maior.
    Observando melhor,
    Notou que tinha seu traço.
    6
    Quando contava seis anos
    A sua mãe faleceu.
    O menino padeceu
    Por falta daquele amor.
    O seu Vicente casou
    Com Maria Conceição.
    Ela não tinha afeição
    Pelo pequenino Antonio
    E por obra do demônio
    Seu pai virou beberrão.
    7
    Cresceu assim o menino
    Estudando o português,
    Geografia e francês
    Lá em Quixeramobim.
    Teve aulas de latim
    Lá na escola do avô.
    Aos estudos se entregou,
    Teve boa formação,
    Pois o pai tinha a intenção
    De fazê-lo confessor.
    8
    No ano cinquenta e cinco
    No dia cinco de abril
    Seu Vicente sucumbiu -
    Morreu seu progenitor.
    Só deixou tristeza e dor
    E tudo que pôde herdar
    Foi três irmâs pra cuidar
    E um comércio falido,
    Muito fiado vencido
    E contas para pagar.
    9
    Casou em cinquenta e sete
    Bem no início de janeiro
    Em sete do mês primeiro
    Com a jovem Brasilina.
    Esse fato determina
    Mudança de profissão.
    Ele atendeu em balcão
    Foi rábula e professor,
    Constantemente mudou,
    Parecendo em procissão.
    10
    Seu casamento ia bem,
    Nasceram duas crianças.
    Renovaram as esperanças
    De futuro promissor.
    Porém, teve o dissabor
    De ver a sua mulher,
    A companheira de fé,
    Fugir com policial
    Numa conduta imoral
    Sem explicação qualquer.
    11
    Novamente se mudou
    Após aquele ocorrido.
    Ficou bastante abatido
    Com "desmanche" do seu lar.
    Tempos depois viu chegar,
    Com Joana, mais um filho
    Quando já era andarilho
    Por todo o seu Ceará.
    Qualquer cidade a cruzar
    Já não era um empecilho.
    12
    No ano setenta e três
    A fronteira cruzaria
    E foi visto na Bahia
    Já em peregrinação.
    Tinha a determinação
    De quem tem objetivos
    E dava muitos motivos
    Para alguém acreditar
    Que promessa ia pagar
    Aqui no mundo dos vivos.
    13
    Essas pesquisas eu fiz
    Porque algo me faltava
    Nenhuma "fonte" explicava
    Um fato muito importante.
    Aquela imagem "intrigante"
    Que planejou "Conselheiro".
    O comerciante e obreiro
    Que "bolou" um "visual"
    Que fascinou sem igual
    No cenário brasileiro:
    14
    De barba e grandes cabelos
    Alto e magro de feição
    Com batina de azulão
    Nos pés sandálias de couro.
    Imagem de bom agouro
    Só andava de bastão
    E na cintura um cordão
    Com enorme crucifixo.
    Naquela imagem me fixo
    Procurando explicação.
    15
    Não bastasse aquela "imagem"
    Tinha um certo ritual.
    Era caso habitual
    Pedir ao rico pro pobre.
    Essa atitude tão nobre
    Dava mais o que pensar
    E só fazia espalhar,
    Pelo sertão, sua fama.
    Aquilo era uma trama
    Difícil de destrinchar.
    16
    E nesse ponto eu parei
    Pensando o que fazer.
    - Continuar a escrever
    Sem essa luz clarear?
    Refletindo, fui deitar
    Tava cansado e dormi
    E no sonho eu consegui!
    É que nesse sonho meu
    Conselheiro apareceu
    E me contou tudo...*ali.
    17
    - *O fato que quer saber
    Eu fiz de caso pensado,
    Depois de ter estudado
    A mente do sertanejo
    Eu auscultei seu desejo
    Para a minha atuação.
    Fiz essa "transformação" -
    Trabalho de marqueteiro.
    No Brasil fui o primeiro
    A ter essa profissão.
    18
    - Ocorreu no Ceará
    A desavença cruel
    Da família Maciel
    Com todos os Araújo.
    Não havia um só refúgio,
    Isso marcou gerações,
    Ensanguentou os sertões
    Com morte de vinte e cinco.
    Eu rezei com muito afinco
    Pra cessarem as agressões.
    19
    - Nessas minhas orações
    Fiz promessa benfazeja:
    Construir uma igreja
    Pra cada morte ocorrida.
    E que toda essa ferida
    Viesse a cicatrizar
    Que jamais no Ceará
    Reinasse a desarmonia.
    Vim pro sertão da Bahia
    Meu sonho concretizar.
    20
    - O final da minha história
    Você já sabe de sobra
    Em todo tipo de obra
    Escrita por bacharel
    Em folhetos de cordel
    E teses de doutorado
    Já tive o crânio estudado
    Pra saber se fui normal.
    Pois na busca do "ideal"
    Vi meu povo trucidado.
    21
    - Eu só pretendia erguer
    Essas casas de oração
    E não sei por que razão
    Parei no Vaza-Barris.
    Por um capricho infeliz
    Construí uma cidade
    Que teve a capacidade
    De se auto-sustentar.
    Todos corriam pra lá
    Para o lugar de igualdade.
    22
    - Canudos em quatro anos
    Lá no sertão era a tal.
    Foi notícia de jornal -
    E incomodou a Nação.
    E o presidente de então,
    O Prudente de Morais,
    Despachou seus "federais"
    Para nos aniquilar.
    Conseguiram consumar
    E o fato foi pros anais.
    23
    - Não cumpri minha promessa,
    Parei lá pela metade.
    Não tive a serenidade
    Cresceu minha empolgação.
    E essa minha ambição
    A mente me confundiu.
    A morte me consumiu
    E para meu desconforto
    Cada um parente morto
    Vi multiplicar por mil.
    24
    - Cheguei ao Terceiro Céu
    Bem no dia que morri.
    E o Comitê dali
    Decretou na ocasião
    Que para minha ascensão
    Por cem anos vou purgar.
    Agora você saberá
    Como foi a minha morte...
    - Por um capricho da sorte,
    Alguém veio me acordar!


    Comentários

    Envie dúvidas, explicações e curiosidades sobre a letra

    0 / 500

    Faça parte  dessa comunidade 

    Tire dúvidas sobre idiomas, interaja com outros fãs de Laécio Beethoven e vá além da letra da música.

    Conheça o Letras Academy

    Enviar para a central de dúvidas?

    Dúvidas enviadas podem receber respostas de professores e alunos da plataforma.

    Fixe este conteúdo com a aula:

    0 / 500

    Opções de seleção