Word Of Mouth

Boca a Boca

Em 1980, como parte de um projeto chamado Boca a Boca,
fui convidado, junto com outros artistas, a ir para Panape,
uma ilha minúscula no meio do Pacífico. A ideia era que
ficássemos conversando por alguns dias e que as conversas
fossem transformadas em um disco falante.
Na primeira noite, estávamos todos bem cansados, mas assim que
nos sentamos, os organizadores montaram todos aqueles microfones
e acenderam mil lâmpadas brancas. E tentamos ao máximo
parecer o mais inteligentes possível. A televisão tinha
chegado a Panape uma semana antes de nossa chegada e havia
uma grande empolgação na ilha, com as pessoas se aglomerando
em torno das poucas TVs. Então, no dia seguinte à nossa chegada,
em uma bizarra repetição do primeiro programa de TV
transmitido em Panape, prisioneiros escaparam de uma prisão,
invadiram a rádio e assassinaram o DJ. Depois, saíram
em uma fúria pela selva, armados com lâminas de cortador de grama.
No total, quatro pessoas foram assassinadas a sangue frio.
Detetives, enviados de Guam para investigar,
estavam por toda parte. À noite, ficávamos em nossos chalés,
ouvindo os sons da selva.

Finalmente, o chefe local decidiu realizar uma cerimônia
para as vítimas do assassinato. A artista Marina Brownovich
e eu fomos, como representantes do nosso grupo, para filmar.
A cerimônia aconteceu em um grande abrigo de palha e
a maior parte envolveu cozinhar feijão em buracos e
preparar uma bebida escura a partir de raízes. O cheiro
era avassalador. Cães latindo por toda parte.
E todo mundo parecia estar se divertindo bastante...
considerando que era um funeral.

Depois de algumas horas, Marina e eu fomos apresentados ao chefe,
que estava sentado em uma plataforma elevada acima dos buracos.
Fomos informados de que não podíamos virar as costas para o chefe
em nenhum momento ou estar em uma posição mais alta que ele.
Então, subimos na plataforma com nosso equipamento de filmagem
e meio que andamos de costas até o chefe. Como presente,
trouxe uma daquelas câmeras do Fred Flintstone,
aquelas em que o cartucho de filme é também o corpo da câmera,
e a entreguei ao chefe. Ele parecia encantado e começou a tirar fotos.
Ele não estava avançando o filme entre as fotos, mas como
nos disseram que não deveríamos falar a menos que fôssemos
abordados, não consegui avisá-lo que ele não conseguiria
doze fotos, mas apenas uma, muito, muito complicada.

Depois de mais algumas horas, o chefe levantou a mão,
e houve um silêncio absoluto. Todos os cães pararam de latir.
Olhamos ao redor e vimos os cães. Todas as suas gargantas
haviam sido cortadas simultaneamente e seus corpos,
ainda respirando, perfurados com varas, estavam girando
nos buracos. O chefe insistiu que nos juntássemos à refeição,
mas Marina ficou pálida e eu perguntei se poderíamos
apenas levar a nossa para viagem. Eles cuidadosamente
embrulharam os cães em folhas e nós carregamos seus corpos embora.