Depois do Amor

“Depois do Amor”: amor como ação em uma cidade fria

Em “Depois do Amor”, de NGA, amor não é romance: é uma ética de cuidado que vale mais que status ou dinheiro. “Harmonia” atua em dois planos: o som que cura (reforçado pela melodia de Srta Paola) e a ideia de conciliação social numa cidade que esfria as pessoas. O rapper descreve desilusão e desigualdade — “mundo mais cinzento”, “selva de cimento”, fome, menos calor humano — onde cor ou rótulo, “fora branco, fora preto”, não mudam a dor comum. Em vez de glamorizar o sofrimento, ele recusa a “nobreza na tua tristeza” e afirma valores: “Conhecimento é riqueza, arrogância é pobreza”. Critica um sistema que pune pouco quem causa dano e amplia distâncias. As barras “perde preço, ganha valor” e “ou te afogas na vida, ou te afogas em dívidas” trocam a régua: sair do preço para o valor, da obsessão por dinheiro para visão e caráter. Não por acaso, ele crava: “Música é a minha terapia” — em sintonia com o lançamento em Filho das Ruas II (2018), que propõe usar a melodia para achar harmonia e melhorar o dia.

O refrão fecha a tese: “Depois do amor nada importa”. Duas leituras: quando a ação é guiada por amor, o resto perde peso; sem esse eixo, nada faz sentido. Daí o foco em gestos práticos — “Se não for por ti, então faz por alguém” e até um simples “bom dia” — como antídoto à apatia. NGA admite ceticismo, com “o que nos separa é maior que aquilo que nos une”, e pondera que a sintonia talvez “não passe de fantasia”. Mesmo assim, a faixa empurra para uma esperança ativa: brindar a vida, não repetir a história, exercer misericórdia e não cantar vitória antes da batalha. A voz de Srta Paola acrescenta contraste ao rap cru, encarnando o remédio proposto: música como terapia, amor e solidariedade para atravessar a selva de cimento.