Flor da Pele (part. Zeca Baleiro)

“Flor da Pele (part. Zeca Baleiro)” entre febre e calma

Há um espelhamento curioso na trajetória de “Flor da Pele (part. Zeca Baleiro)”: a letra diz “qualquer beijo de novela me faz chorar”, e a versão de 2018 de Rachell Luz, com Zeca Baleiro, virou tema de Luz e Gabriel em O Sétimo Guardião. Essa exposição midiática dá corpo à hipersensibilidade que a canção descreve, um estado permanente de alerta emocional. Composta por Zeca Baleiro em 1989 e gravada por ele em 1997, a música encena como pequenos estímulos — um beijo visto na TV, um olhar na janela — disparam um turbilhão em que desejo se confunde com exaustão e com a “vontade de não ser”. Quando a voz afirma ter “o fogo do juízo final” na pele, a paixão surge como febre que consome e ameaça, no limite entre prazer e colapso.

A narrativa oscila entre autoproteção e risco: “às vezes me preservo / noutras, suicido” funciona como hipérbole de autossabotagem ou entrega total, numa chave emocional, não literal. A repetição com pequenas variações — “vontade de não ser / vontade de nem sei” — mostra a mente entre nomear a dor e perder as palavras. Já as figuras de desamparo — “um barco sem porto”, “cavalo sem sela”, “cão sem dono” — traduzem uma liberdade sem direção, que também é vulnerabilidade. No centro, está uma sensibilidade extrema, tocada por tudo, movida pelo impulso de sentir sem filtros e pelo medo de se apagar nisso. O resultado é um desamparo febril: alguém em combustão interna, entre o ímpeto de amar e o instinto de se proteger, sempre à beira do transbordamento.