Preta Que Pariu

Ele tinha 14 anos, podia ser seu filho
Seu sobrinho, seu aluno ou você no passado
Podia ser tanta coisa não fosse o gatilho
Podia virar notícia por ser premiado

Mas o prêmio a sua mãe dado pela polícia
Foi o uniforme escolar ensaguentado
E o nome do seu filho na estatística
E o exame de balística atestando que ele foi executado

Vocês falam pros pivete estudar
Aquela conversa fiada de futuro
E até pra jogar menos bola
Então me diz por que que uma criança
Foi assassinada pelo Estado a caminho da escola

A farda que tirou aquela vida não vai conseguir
Tirar de nós a força pra continuar lutando
Enquanto pudermos estar de pé
Sobre este chão ensaguentado
Todos seguiremos vivos e gritando

Marcos Vinícius, presente!
Marielle, presente!
E todos os que não passaram no noticiário

Israel Borges, presente!
E o Cabula, presente!
Amor para as famílias, morte aos que nos mataram!

Carandiru, presente!
Candelária, presente!
E todos os que não passaram no noticiário

Cláudia Ferreira, presente!
Toda mãe preta, presente!
Amor para as famílias, morte aos que nos mataram!

Chei de ódio nessa praça, cês tão rindo de que graça?
Quando passa de dez horas, eu sou guia ou comparsa
Nunca mais fumei, amassa, papel comido por traça
Essa neura me consome, se eu fingir vai ser uma farsa

Antes fechasse no bang, jogasse no time, gang
Fazer fita no Hemoba só pra acumular mais sangue
Bomba no Palácio Grande, gasolina nas estantes
Trincar tela e cuspir fogo na pegada DDTank

Mas pra ti sou objeto, minha mãe quer ter um Neto
O prefeito né perfeito, corta caule e põe dejeto
Ninguém quer me ver de perto, levo a vida dos inseto
Quando eu saio e num aviso, Daza sofre e olha pro teto

Mãe guerreira, eu sei, é foda, filho preto incomoda
Dreadlock e jeito sujo, é artista ou faz a moda
Cê fingiu, fugiu e volta, traga, bebe e depois solta
Beija a boca do meu filho, e com certeza, a minha adoça

Senhor, desce ligeiro
Antes que a PM suba e leve mais um verdadeiro
Mais uma vida, uma história a ser construída
Apagada do caderno antes mesmo de ser escrita

Sete palmos, uma cor e idades distintas
Vários lugares e a desculpa eu sei de cor
Sempre suspeito porque o aval é genocida
Mais uma perdida achada no corpo de um menor