Lig-Lig-Lig-Lé

“Lig-Lig-Lig-Lé”: humor, imigração e batida de marcha

O refrão onomatopaico não é só brincadeira rítmica: “lig-lig-lig-lé” imita o som dos tamancos de chineses que trabalhavam em restaurantes baratos do Rio nos anos 1930. Já “Dez tões, vinte pratos, banana e café” ecoa o “dez tostões” da época, quando se comia muito pagando pouco. Como marchinha antiga regravada por Adriana Partimpim, “Lig-Lig-Lig-Lé” vira historinha musical sobre um imigrante apelidado de “Seu China”, que caminha “na ponta do pé” (ou “na pontinha do pé”), enquanto a percussão de sílabas marca o passo da marcha. O arranjo infantil de 2004 atualiza o charme para o ouvido das crianças sem perder a cadência de roda.

A narrativa é direta: “Chinês come somente uma vez por mês” exagera de propósito, típico da marchinha, e prepara o enredo de quem decide não “ir a Xangai buscar a butterfly (borboleta)” para, em vez disso, “fazer a sua fé” com uma morena no Brasil. “Butterfly” funciona como apelido carinhoso da amada e sugere leveza; “fazer a sua fé” tanto indica criar raízes quanto “fazer sua aposta” no novo lugar. As imagens de “Seu China”, Xangai e a “morena” compõem um encontro cultural e afetivo: o estrangeiro seduzido pelo clima local, pela comida farta e pela companhia, a ponto de ficar.

O efeito vem do jogo de repetição e das onomatopeias, que transformam passos em música e comida em ritmo — é carnaval em forma de canção. Lidas hoje, expressões como “Seu China” e a hipérbole “come somente uma vez por mês” revelam estereótipos do período; com filtro histórico, entende-se como parte do imaginário das marchinhas. A releitura de Adriana Partimpim suaviza essas arestas ao realçar o lúdico e o som das palavras, deixando um clima alegre e convidativo para cantar em coro.