Ópera

Drama urbano e autoafirmação em “Ópera”, de Aklipe44

Em “Ópera”, de Aklipe44, a chave vira: a faixa encena um melodrama urbano em que coração ferido, vaidade e dinheiro disputam o palco. Com base híbrida de Bossa Nova e Baile Funk, 118 BPM e produção do 4LIFE Collective, o clima dançante contrasta com a desilusão e a pose de superação. O verso “Os bico tão cantando tá até parecendo ópera” ironiza o coro de fofoca que cerca a história. No centro está a ferida amorosa — “Quando eu te dei meu coração cê falou foda-se” — enfrentada com blindagem: “Com ou sem você eu vou seguir contando nota”. “Contando nota” afirma hustle e, por possível duplo sentido, também evoca notas musicais, um encaixe esperto para uma faixa chamada “Ópera”. Ele preserva orgulho e unicidade — “Você nunca vai me achar me procurando em outras cópias” —, embora admita que a memória ainda dói: “apaguei todas as fotos mas não apaguei memórias”.

A trama gira no vai e volta com a “bad bitch gótica”/“feiticeirinha”: sedução sombria, recaídas — “Outro flashback” — e suspeita de interesse — “Eu sei que essa danada tá querendo meu cash”. Mesmo se gabando — “Todo beat eu mato”/“minha conta é tão gorda” —, ele cai na contradição entre cinismo e desejo: “De que vale a vida, se eu não for morrer amando?”. Lê sinais de jogo (a “voz de choro” e a recusa do anel da Pandora, por parecer aliança) como distância de compromisso diante da grana. Ao mesmo tempo, fantasia cuidado e posse — “vou te dar uma ilhazinha” — e pisca à linhagem romântica da MPB: “Como Djavan dizia”. Metáforas como “essa mulher é uma guilhotina” e “a corda no pescoço… apertando” acentuam a pressão. Lançada em 2023 (2m26s), “Ópera” transforma desilusão e superação em espetáculo de pista: orgulho, carência e dinheiro embalados para dançar e rir da própria dor.