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Bêbado Pintor

Alfredo Marceneiro

Letra

    Encostado sem brio ao balcão da taberna
    De nauseabunda cor e tábua carcomida
    O bêbado pintor a lápis desenhou
    O retrato fiel duma mulher perdida

    Era noite invernosa e o vento desabrido
    Num louco galopar ferozmente rugia,
    Vergastando os pinhais, pelos campos corria,
    Como um triste grilheta ao degredo fugido.
    Num antro pestilento, infame e corrompido,
    Imagem de bordel, cenário de caverna,
    Vendia-se veneno à luz duma lanterna
    À turba que se mata, ingerindo aguardente,
    Estava um jovem pintor, atrofiando a mente,
    Encostado sem brio ao balcão da taberna.


    Rameiras das banais, num doido desafio,
    Exploravam do artista a sua parca féria,
    E ele na embriaguez do vinho e da miséria,
    Cedia às tentações daquele mulherio.
    Nem mesmo a própria luz nem mesmo o próprio frio,
    Daquele vazadouro onde se queima a vida,
    Faziam incutir à corja pervertida,
    Um sentimento bom d'amor e compaixão,
    P'lo ébrio que encostava a fronte ao vil balcão,
    De nauseabunda cor e tábua carcomida.


    Impudica mulher, perante o vil bulício
    De copos tilintando e de boçais gracejos,
    Agarrou-se ao rapaz, cobrindo-o de beijos,
    Perguntando a sorrir, qual era o seu oficio,
    Ele a cambalear, fazendo um sacrifício,
    Lhe diz a profissão em que se iniciou,
    Ela escutando tal, pedindo-lhe alcançou
    Que então lhe desenhasse o rosto provocante,
    E num sujo papel, o rosto da bacante
    O bêbado pintor com um lápis desenhou.


    Retocou o perfil e por baixo escreveu,
    Numa legível letra o seu modesto nome,
    Que um ébrio esfarrapado, com o rosto cheio de fome,
    Com voz rascante e rouca à desgraçada leu,
    Esta, louca de dor, para o jovem correu,
    E beijando-lhe o rosto, abraço-o de seguida...
    Era a mãe do pintor, e a turba comovida,
    Pasma ante aquele quadro, original, estranho,
    Enquanto o pobre artista amarfanha o desenho:
    O retrato fiel duma mulher perdida.


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