Análise completa do samba-enredo da Mangueira para 2025

Conheça o significado do samba-enredo da Estação Primeira de Mangueira para 2025, à Flor da Terra, que fala sobre o povo Banto no RJ.

Analisando letras · Por Ana Paula Marques

27 de Fevereiro de 2025, às 12:00


O que você acha de conferir uma análise completa do samba-enredo da Mangueira para 2025? Poucas escolas carregam tanta tradição quanto a Estação Primeira de Mangueira, e a agremiação vai com tudo para tentar seu 21° título no Carnaval carioca.

samba-enredo da Mangueira para 2025
Reprodução / YouTube

A verde e rosa é conhecida por seu compromisso com enredos que exaltam a cultura brasileira e resgatam memórias fundamentais da história do país, e é por isso que vai apostar no samba À Flor da Terra, no Rio da Negritude entre Dores e Paixões

A agremiação – que será a última a desfilar no domingo (2 de março) – vai celebrar a influência dos povos bantus e africanos, que foram fundamentais na formação da identidade carioca, prometendo um desfile grandioso. Continue lendo para saber mais!

Mangueira 2025: análise do samba-enredo

O samba-enredo da Mangueira em 2025 vai levar para a Marquês de Sapucaí uma poderosa celebração da herança bantu e de sua influência na construção cultural e social do Rio de Janeiro. 

Com À Flor da Terra – No Rio da Negritude Entre Dores e Paixões, a verde e rosa propõe um resgate histórico que dá protagonismo a milhões de africanos que desembarcaram no Cais do Valongo, trazendo consigo tradições que moldaram a identidade carioca. 

O desfile será uma homenagem à força, à dor e à paixão dos povos bantus, destacando sua importância na formação da cidade e recontando histórias que foram, por muito tempo, silenciadas.  

A herança bantu e a construção da identidade carioca

Os povos bantus compõem um dos maiores agrupamentos linguísticos da África e foram a maioria dos africanos trazidos ao Brasil em condição de escravização. 

No Rio de Janeiro, sua chegada pelo Cais do Valongo marcou o início de uma trajetória de lutas, adaptações e resistência, que transformou profundamente a vida na cidade. 

As crenças religiosas, os rituais, as músicas e os modos de organização social dos bantus ecoam até hoje nas práticas culturais do povo carioca, desde os terreiros até o samba.  

O enredo da Mangueira busca ir além do olhar tradicionalmente voltado para a herança nagô-iorubá, lançando luz sobre as contribuições dos bantus na concepção de mundo, na forma de viver e se relacionar com o território. 

O desfile no domingo de Carnaval trará a ressignificação da expressão “à flor da terra”, exaltando a vivência negra no solo carioca, que floresce apesar das dores e das tentativas de apagamento.  

Entre dores e paixões: a cultura bantu na cidade  

A narrativa desenvolvida pelo carnavalesco Sidnei França mergulha na dualidade que permeia a experiência bantu no Rio: a dor da diáspora forçada e da opressão, mas também a paixão e a vitalidade que marcaram suas expressões culturais

O desfile da Mangueira irá destacar como essa população se estabeleceu na cidade, interagindo com diferentes religiões e costumes, construindo novas formas de sociabilidade e resistência.  

O batuque dos tambores, os ritos ancestrais e as manifestações artísticas dos bantus ganharão vida na Sapucaí, transformando o desfile em um ato de celebração e memória. 

Com a energia pulsante de sua comunidade e um compromisso inegável com a resistência cultural, a Mangueira mais uma vez reafirma seu papel de escola engajada, trazendo para a avenida uma homenagem inesquecível à ancestralidade negra.

Análise da letra do samba-enredo da Mangueira 2025

O samba-enredo da Mangueira se apresenta como uma manifestação de ancestralidade, resistência e identidade negra

Composta por Lequinho, Júnior Fionda, Gabriel Machado, Júlio Alves, Guilherme Sá e Paulinho Bandolim, a letra traduz, de forma poética e simbólica, a trajetória e a contribuição do povo Bantu na construção do Rio de Janeiro e da cultura brasileira.

A introdução do samba já evidencia uma forte presença dos elementos africanos, evocando Oyá (Iansã), a orixá dos ventos e das tempestades, associada à força e à transformação. 

Oya, Oya, Oya ê

Oya Matamba de kakoroká zingue

Oya, Oya, Oya ê ô

Oya Matamba de Kakoroká zingue ô

O canto invoca essas potentes figuras, estabelecendo a conexão entre espiritualidade, ancestralidade e cultura afro-brasileira e exaltando o samba como herdeiro e transmissor dessa história.

O orgulho da favela e a resistência negra

No enredo, a Mangueira se coloca como a voz dos excluídos, dos que fizeram da favela um espaço de cultura e sobrevivência.

Sou a voz do gueto, dona das multidões

Matriarca das paixões, Mangueira

O povo banto que floresce nas vielas

Orgulho de ser favela

Essa personificação da escola como uma “matriarca” resgata a ideia das mulheres negras como pilares da comunidade, seja na história, seja na religião, seja no próprio samba.

Outro momento impactante do samba é a alusão à trajetória dos negros africanos trazidos ao Brasil, lembrando a dolorosa travessia atlântica e a luta constante dos povos Bantu para manter viva sua identidade. 

Sou Luanda e Benguela

A dor que se rebela, morte e vida no oceano

Resistência quilombola

Dos pretos novos de Angola

De Cabinda, suburbano

Tronco forte em ribanceira

O samba ainda enaltece as manifestações culturais de matriz africana que sobrevivem no Brasil, como o jongo, a capoeira e os tambores do Congo, exaltando a presença e a contribuição do povo Bantu.

Ê malungo, que bate tambor de Congo

Faz macumba, dança jongo, ginga na capoeira

Ê malungo, o samba estancou teu sangue

De verde e rosa, renasce a nação de Zambi

A palavra “malungo”, usada pelos negros escravizados para se referir a seus irmãos de dor, reforça a irmandade e a luta compartilhada.

Religião e sincretismo

A análise do samba-enredo da Mangueira 2025 também revela o protagonismo da religião na cultura bantu, fazendo referência ao Candomblé de Angola e à influência dos inquices (divindades dessa tradição).

Bate folha pra benzer, Pembelê, Kaiango

Guia meu camutuê, Mãe Preta ensinou

Bate folha pra benzer, Pembelê, Kaiango

Sob a cruz do seu altar, inquice incorporou

O trecho acima também sugere o papel das “Mães Pretas”, mulheres que transmitiram saberes e espiritualidade ao longo das gerações.

A sonoridade do samba é marcada por ritmos que remetem à percussão afro-brasileira, com referências ao tambor e aos toques angolanos, criando uma fusão entre o passado e o presente. 

A marginalização e a resistência na sociedade

O samba também denuncia o racismo e a marginalização da cultura negra, com uma crítica à criminalização histórica da população negra, seja pelas leis contra a vadiagem no pós-abolição, seja pelo preconceito estrutural que persiste.

Forjado no arrepio

Da lei que me fez vadio

Liberto na senzala social

Malandro, arengueiro, marginal

A composição ainda toca na questão da apropriação cultural, criticando como elementos da cultura negra, antes marginalizados, são hoje celebrados

Denuncia-se como o samba e outras manifestações negras foram combatidas, mas agora são adotadas pela sociedade sem o devido reconhecimento histórico.

Meu som, por você criticado

Sempre censurado pela burguesia

Tomou a cidade de assalto

E hoje, no asfalto

A moda é ser cria

Quer imitar meu riscado

Descolorir o cabelo

Bater cabeça no meu terreiro

A conclusão do samba reafirma a celebração da vida e a continuidade da história negra na cidade do Rio de Janeiro, mostrando que a ancestralidade negra não apenas resiste, mas continua moldando a cultura carioca e brasileira.

Descubra a origem dos sambas-enredos, símbolos do Carnaval brasileiro

Se você gostou da análise sobre o samba-enredo da Mangueira em 2025, aproveite para conferir o conteúdo sobre como surgiram os sambas-enredo, estilo musical que ajudou a definir o formato do Carnaval como hoje o conhecemos!

Como surgiram os sambas-enredo

Confira mais análises dos sambas-enredo de 2025


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