Conheça o significado da música Ideologia, de Cazuza

Considerada por alguns fãs a melhor música de Cazuza, Ideologia foi composta em um dos momentos mais conturbados do cantor.

A canção faz parte do álbum homônimo, o terceiro da discografia solo do cantor. 

A letra carrega um pessimismo diante da vida, do amor e da situação política do Brasil. E faz total sentido, já que ela foi escrita logo depois de o cantor ter descoberto o seu diagnóstico de HIV. 

Depois de um período nos Estados Unidos para realizar um tratamento, Cazuza voltou para o Brasil e começou a gravar o álbum, que foi lançado em 1987.

Ideologia é um disco visceral, que reúne grandes canções da carreira do cantor, inclusive a que vamos analisar juntos a seguir. Vem com a gente desbravar o universo de Cazuza!

Significado da música Ideologia

Ideologia foi composta por Cazuza e musicada por Frejat, companheiro e amigo do cantor, da época do Barão Vermelho. A canção compila assuntos relacionados ao próprio pensamento de Cazuza e aspectos do Brasil daquele período.

Pode parecer estranho, mas passaram-se mais de 30 anos desde o lançamento da canção, e é incrível notar o quanto a sua temática continua atual.

A faixa abre o disco homônimo, apresentando um Cazuza que parece desnudar-se enquanto ser humano cheio de sonhos, ideais e vontades de mudar o mundo, mas que, de repente, percebe que nada disso seria possível diante de um Brasil tão diverso e complexo. 

O próprio cantor chegou a declarar que não sabia muito bem o significado da palavra ideologia e foi buscar no dicionário. Encontrou que a palavra indicava correntes de pensamentos, conjunto de ideias relacionadas à cultura, ao social e à política.

Foi a partir disso que ele escreveu uma música sobre a história de sua geração. O compositor carioca traduziu em versos a frustração de uma juventude que cresceu sob o domínio militar, e quando se viu livre, continuou com um comportamento retrógrado e moralista.

Nascia ali todo o desabafo de Cazuza. 

Análise da letra da música Ideologia    

Meu partido
É um coração partido
E as ilusões
Estão todas perdidas
Os meus sonhos
Foram todos vendidos
Tão barato que eu nem acredito
Ah! Eu nem acredito

Com esse começo tão genial, Cazuza faz alusão ao dizer que o seu único partido é um coração triste, despedaçado.

Na primeira estrofe, o compositor esbraveja toda o seu desalento e frustração diante dos rumos políticos do país naquela época, entremeando com os seus sonhos.

Para ele, era como se o futuro, tão aguardado após anos de repressão, tivesse sido roubado dos jovens. Os sonhos foram roubados, vendidos por um preço medíocre, o que o deixa incrédulo.

Que aquele garoto
Que ia mudar o mundo
Mudar o mundo
Frequenta agora
As festas do Grand Monde

O personagem da música mudou, amadureceu e precisou, ou foi obrigado, a rever seus conceitos e ideais. Isso pode dar margem para justificar o nome da música, Ideologia, que casa com tudo o que Cazuza retrata na letra.

Ele se reconhece, observa que o garoto que um dia quis mudar o mundo, agora está frequentando festas do Grand Monde, que pode ser compreendido como eventos luxuosos, de alta sociedade. O termo Grand Monde, do francês, significa grande mundo. 

Por outro lado, reza a lenda que Grand Monde era uma balada LGBT de luxo em São Paulo. Cazuza faz uma autocrítica, reconhecendo a sua mudança e uma certa incoerência ideológica.

Meus heróis
Morreram de overdose
Meus inimigos
Estão no poder
Ideologia!
Eu quero uma pra viver
Ideologia!
Eu quero uma pra viver

Imagine a situação de Cazuza: se descobrir doente, observar a situação política terrível do país e perceber que seus maiores ídolos estavam morrendo.

Ícones da música como Jimi Hendrix e Janis Joplin partiram de forma trágica, e Cazuza se sentia perdido. 

Ele buscava uma nova ideologia para viver, porque tudo parecia sem força, sem sentido. Como se sentir engajado diante de um cenário sem vida, sem perspectiva?

Esse refrão soa como um grito de Cazuza em busca de ressignificar o seu olhar diante da vida. 

O meu prazer
Agora é risco de vida
Meu sex and drugs
Não tem nenhum rock ‘n’ roll
Eu vou pagar
A conta do analista
Pra nunca mais
Ter que saber
Quem eu sou
Ah! Saber quem eu sou

Aqui, Cazuza se coloca ainda mais na música, ao dizer que o prazer dele agora é risco de vida. Ele já sabia de sua condição quando compôs Ideologia e tinha noção dos perigos por conta da doença. 

Havia muitos mistérios e poucas pesquisas sobre o HIV na década de 80, os recursos eram praticamente inexistentes e as pessoas diagnosticadas tinham um tempo de vida muito curto. 

Esta estrofe é dura, triste, por falar exatamente sobre o problema do cantor. Os tempos bons de sexo e rock ‘n’ roll estavam com os dias contados. O prazer que ele tinha com o sexo agora era um risco. 

A angústia era tamanha que valia a pena pagar o analista para se esquecer de quem ele era. Cazuza sabia que precisava se render, aceitar a situação sem volta, já que não existia cura, e tentar seguir a vida até onde o universo lhe permitiria. 

Pois aquele garoto
Que ia mudar o mundo
Mudar o mundo
Agora assiste a tudo
Em cima do muro
Em cima do muro!

O garoto tão engajado, sonhador, que esperou tanto por uma vida de liberdade, se via encurralado. Para ele, o que restava era assistir o conservadorismo ainda tomar conta do país.

Ele queria ao menos encontrar uma ideologia para continuar acreditando que valia a pena lutar por algo. Cazuza chegou a comentar, na época, que os jovens tinham batalhado tanto, mas agora se sentiam perdidos. 

A música é dura, pesada, mas é genial fazer um contraponto dos ideais do passado com a situação medonha que todos estavam vivendo, sem nenhuma postura revolucionária. 

Eles não queriam, mas, de repente, se viram diante de um Brasil apático e sem posicionamento. Uma letra honesta e que retrata uma geração arruinada em busca de uma ideologia pra viver.  

As melhores frases de Cazuza 

As ideias de Cazuza nos inspiram até hoje. O grande poeta criou músicas eternas sobre o amor, questões sociais e políticas que sempre irão impactar gerações futuras. 

Reunimos as melhores frases de Cazuza para você relembrar sua genialidade e compartilhar as melhores nas redes sociais. 

Leia mais sobre o Cazuza 

• A história da música Codinome Beija-Flor, de Cazuza
• Análise da música O Tempo Não Pára, obra-prima de Cazuza