Beatriz

Dualidade e idealização na canção “Beatriz” de Chico Buarque

Em “Beatriz”, Chico Buarque faz referência direta à musa de Dante na "Divina Comédia" ao escolher esse nome para a personagem central da canção. Essa escolha traz uma aura de idealização quase mística à figura da atriz, reforçada nos versos “será que é comédia / será que é divina / a vida da atriz”. Aqui, Chico não só faz alusão à obra de Dante, mas também destaca a dualidade entre o sublime e o cotidiano na vida artística. A alteração recente do verso para “será que é divina / a sina da atriz” aprofunda ainda mais a ideia de destino, sugerindo o peso e a inevitabilidade da trajetória de quem vive para encantar, mas muitas vezes permanece envolto em mistério e solidão.

A letra é construída a partir de perguntas sobre a verdadeira natureza da atriz: “Será que ela é moça / Será que ela é triste / Será que é o contrário / Será que é pintura / O rosto da atriz”. Essas dúvidas mostram tanto a dificuldade de conhecer quem está sempre em cena quanto a tendência de idealizar figuras públicas, projetando nelas desejos e fantasias. O desejo de “entrar na sua vida” revela a busca por intimidade e compreensão, mas também reconhece a distância intransponível entre o observador e o objeto de admiração.

A canção ainda aborda a fragilidade e o risco presentes na felicidade e na realização artística, como nos versos “Para sempre é sempre por um triz / Aí, diz quantos desastres tem na minha mão / Diz se é perigoso a gente ser feliz”. Chico Buarque e Edu Lobo exploram a instabilidade da vida de artista, marcada por altos e baixos, aplausos e quedas, e a tensão constante entre o desejo de voar e o medo de cair. “Beatriz” se destaca como uma reflexão sensível sobre idealização, solidão e a complexidade de quem vive para o palco.