Criança De Domingo

“Criança De Domingo”: liberdade guiada pelo maracatu

A expressão "criança de domingo" aparece aqui como estado de espírito: leveza meio desajeitada de quem sai para "rodar" sem mapa. Nos versos "eu sábado vou rodar" / "sem saber guiar", o narrador assume a inocência de quem aprende vivendo, mas mantém a vibração positiva. A imagem do fim de semana é simples e generosa: curtir o domingo "faça chuva ou sol" e estender essa energia ao trabalho ao afirmar "segunda é um dia lindo". Essa inversão bate de frente com o ranço da segunda-feira, como se o personagem decidisse prolongar o descanso no modo de olhar o mundo.

Original de Cadão Volpato e Ricardo Salvagni (Fellini), a canção ganha, com Chico Science e a Nação Zumbi, uma ponte sonora entre o urbano pós-punk e o ancestral do maracatu, núcleo do Manguebeat. O próprio Chico definiu sua leitura como "meio como um aboio, uma coisa meio lua de maracatu". O aboio é um canto que guia; em contraste, a letra diz "sem saber guiar". A solução está no corpo: o balanço conduz, enquanto a repetição do refrão cria um transe que embala o giro anunciado no sábado. Anos depois, a expressão ganhou outra camada com a biografia homônima "Criança de Domingo", de José Teles, que ecoa a importância de Chico Science — cuja morte ocorreu num domingo — sem apagar o tom solar que a canção celebra.