Deslizes

Perspectiva feminina e perdão em "Deslizes", de Fagner

"Deslizes", interpretada por Fagner, é frequentemente associada ao sofrimento masculino em relações amorosas, mas, segundo o compositor Michael Sullivan, a letra foi originalmente escrita do ponto de vista feminino. Essa informação muda a leitura de versos como “Se ao teu lado sei tão pouco de você / É pelos outros que eu sei quem você é”, que expressam a vulnerabilidade de uma mulher que, mesmo próxima do parceiro, sente-se distante e precisa recorrer a terceiros para compreendê-lo.

A canção aborda de forma direta os conflitos de um relacionamento marcado por concessões e silêncios. O trecho “Pois aprendi que o meu silêncio vale mais / E desse jeito eu vou trazer você pra mim” revela a tentativa de manter o vínculo afetivo, mesmo diante de traições e incertezas, optando por silenciar o ciúme e aceitar a situação. A cumplicidade imperfeita aparece em “Nós somos cúmplices, nós dois somos culpados / No mesmo instante em que teu corpo toca o meu / Já não existe nem o certo, nem errado / Só o amor que por encanto aconteceu”, mostrando que ambos compartilham a responsabilidade pelo relacionamento conturbado, onde o desejo e o afeto se sobrepõem à moralidade tradicional.

O refrão “E é só assim que eu perdoo os teus deslizes / E é assim o nosso jeito de viver” resume a dinâmica de concessão e autoengano, em que o perdão se torna rotina e a paixão persiste apesar das mágoas. O termo “deslizes” funciona como eufemismo para infidelidades, mas também representa pequenas traições cotidianas que desgastam a confiança, reforçando o tom melancólico e resignado da música. Assim, "Deslizes" vai além do clichê da traição, explorando a complexidade dos sentimentos e a dificuldade de romper padrões afetivos dolorosos.