Pé do Lajeiro

“Pé do Lajeiro”: coragem, folclore e honra no sertão

Em “Pé do Lajeiro”, a onça é bicho real e também símbolo de honra ferida que o sujeito precisa recuperar diante da noiva. O cenário aparece logo no início: “mata do sapé”, “gato fora de hora” rondando o poleiro e, sobretudo, “o pé do lajeiro”, base de pedra onde a fera se esconde. O desfile de figuras do mato e do imaginário — “papa-mé”, “furão” e “caipora” — mistura medo e chiste. “Papa-mé” surge como bicho de história de assustar, “furão” é animal ligeiro do mato, e “caipora” é entidade guardiã da floresta; trio recorrente em gravações e estudos sobre a canção. A repetição “É no pé do lajeiro / Aonde a onça mora” fixa o ponto do perigo e do acerto de contas, quase um endereço do medo.

O motor da trama é a vergonha pública: “Mas inté minha noiva viu a carreira que eu levei... pra mode me envergonhar”. Daí nasce a decisão de virar o jogo com bravata e preparo concreto: “vou pegar a carabina... calçado de botina pra cobra não me morder”, seguida do juramento irredutível “nem que peça a baronesa”. Dá para ler como causo de caça, mas também como metáfora do caboclo enfrentando o próprio medo e o desaforo diante da comunidade: a onça vira a imagem do vexame que precisa ser morto para a honra ficar em pé. Composta por João do Vale e José Cândido (1956), lançada pelo Trio Marayá e relida por Tom Jobim em 1981, a canção atravessa o tempo ao juntar coragem, humor e folclore regional numa cena direta e fácil de visualizar: um homem marcando o lugar do confronto e retomando o respeito perdido.