Peleja de Riachão Com o Diabo

Conflito social e astúcia em “Peleja de Riachão Com o Diabo”

“Peleja de Riachão Com o Diabo”, de Leandro Gomes de Barros, vai além de um simples duelo poético. A obra usa o embate entre Riachão e o Diabo para expor, de forma cômica e provocativa, as tensões raciais e sociais do Nordeste brasileiro do início do século XX. O adversário de Riachão, descrito como “negro da espécie de urubu”, carrega traços que remetem à figura do escravo ou do marginalizado, refletindo o preconceito e a hierarquia social da época. Ao escolher um negro como oponente do cantador branco, Leandro Gomes de Barros não apenas acirra o tom do desafio, mas também dá espaço para personagens historicamente excluídos, que, em outros contextos, poderiam simbolizar resistência e afirmação.

A narrativa segue o formato tradicional das pelejas de repente, em que cada verso é uma tentativa de superar o adversário pela inteligência e astúcia. O Diabo, disfarçado, desafia Riachão em conhecimento, ancestralidade e poder, afirmando: “Eu saí do ideal / Primeiro que apareceu” (Eu vim do princípio, antes de tudo existir), o que reforça sua natureza sobrenatural. O duelo verbal aborda temas como justiça divina, desigualdade social e resignação diante do destino, especialmente quando Riachão lamenta a pobreza do pai e a riqueza do vizinho. O desfecho, com a revelação diabólica e a fuga do adversário em meio a enxofre e tremores, reforça o tom fantástico e moralizante do cordel, deixando em aberto a fronteira entre o humano e o sobrenatural, o opressor e o oprimido.