My Mother & I

Vínculos e espelhos em “My Mother & I”, de Lucy Dacus

Mesmo sendo adotada, Lucy Dacus investiga como a mãe lhe transmitiu inseguranças e afeto pelo convívio, não pelo sangue. Ancorada no Dia das Mães e na temporada de Touro, “My Mother & I” usa a astrologia como linguagem de intimidade: “The stars have a lot to say / About babies born in the month of May” (As estrelas têm muito a dizer / sobre bebês nascidos no mês de maio). Em seguida, reforça traços taurinos — “We are down to Earth” (Somos pé no chão) e “We dig our feet in” (Nós firmamos os pés) — para falar de realismo, empatia e busca de conforto. A narrativa começa no corpo: “My mother hates her body / We share the same outline” (Minha mãe odeia o corpo dela / compartilhamos o mesmo contorno), e se estende à identidade porosa de quem “blur at the edges” (borra nas bordas) e vive “shapeshifting all the time” (mudando de forma o tempo todo). O espelho entre mãe e filha mostra como imagem corporal e afeto viram hábitos e linguagem, mesmo sem laço biológico. No contexto do EP 2019, dedicado a datas específicas, a canção soa como presente ritual para a mãe e para esse signo compartilhado, em tom sereno e íntimo.

Na segunda metade, corpo e espiritualidade se misturam para tratar de medo, amadurecimento e finitude: “They called me an old soul / the difference between a soul and a ghost” (Me chamaram de alma velha / a diferença entre uma alma e um fantasma) expõe a confusão entre sabedoria precoce e assombro. “Trapped in my body / A spirit searching for her second life” (Presa no meu corpo / um espírito buscando sua segunda vida) pode falar tanto do desconforto corporal quanto do eco da adoção, essa “segunda vida” que procura lugar. O desejo taurino por estabilidade aparece claro: “We want love / Warm and forever / We want to die in the presence of our loved ones” (Queremos amor / quente e para sempre / queremos morrer na presença de nossos entes queridos). O desfecho concentra a tensão entre perdão e abandono: “All she has given / All I have taken / All is forgiven / All is forsaken” (Tudo que ela deu / tudo que eu tomei / tudo é perdoado / tudo é abandonado), sugerindo cura possível, mas sem negar as perdas necessárias para seguir.