Um Cara Cool

Entre piada, crime e culpa em “Um Cara Cool”, de MC V.V

O refrão esconde um xingamento com trocadilho: “Vai tomar no cool”, em que “cool” (legal) soa como “vai tomar no cu”. O sample de “Dilemma” (Nelly com Kelly Rowland) reforça a ironia de um “dilema amoroso” criado pelo próprio narrador, que posa de bacana enquanto coleciona crimes. A faixa de MC V.V, lançada no BONDA 2 (2022) com produção de JANGO, narra o fracasso afetivo de um sujeito que tenta comprar validação com “perfume bem caro, blazer raro, carro importado”. O humor ácido aparece quando a máscara cai: ao explicar de onde “a grana vem”, ele admite ter “matado um milionário” e roubado tudo — e descobre na hora que a mulher do bar é sobrinha da vítima. O refrão, com “boo” (namorada) e o trocadilho “cool/cu”, vira mantra de autoengano: ele se diz legal, mas o próprio discurso mostra por que ninguém fica.

A narrativa piora na delegacia: ele flerta com uma PM, fantasiando “química”, e confessa ter passado a juventude na FEBEM por incendiar uma casa aos 16. A virada é cruel e cômica: era a casa dela, a mãe morreu no incêndio, e ele responde “Não vejo como isso é minha culpa”, selando a falta total de empatia. As coincidências absurdas operam como hipérbole e piada recorrente: toda tentativa de impressionar expõe o desastre moral do protagonista. O refrão volta como soco cômico e triste, sintetizando temas de status e aparência vazios, consequências inevitáveis e isolamento. Com DNA de YUNG LIXO no humor negro e o contraste do sample romântico de “Dilemma”, “Um Cara Cool” satiriza quem quer amor sem encarar o próprio rastro de dano.