Do Tempo Que (part. Paulo Massadas)

“Do Tempo Que (part. Paulo Massadas)” e a virada do sentido

Lançada em 1989 como primeira abertura do Domingão do Faustão, “Do Tempo Que (part. Paulo Massadas)” usa viradas de sentido para comentar, com humor, como os costumes mudaram. A dupla Michael Sullivan & Paulo Massadas transforma a nostalgia em piada de domingo, num formato popular e televisivo. Já no início, “topete, brilhantina e vaselina” fixa o retrato de época, enquanto os trocadilhos fazem o diagnóstico: “sapato grande era sapatão” contrapõe o literal ao uso que virou gíria para lésbica; “galinha era comida só de domingão” opõe o frango do almoço à gíria para mulher considerada “fácil”. A graça vem da inocência assumida em “Naquele tempo tudo era normal”, frase que expõe o choque geracional com leveza e ironia.

A letra encadeia ambiguidade atrás de ambiguidade para mostrar a mudança linguística e social. “Homem que comia homem era só canibal” evidencia o salto de “comer” do sentido literal ao sexual; “dar colher” sai de entregar o talher para “dar trela”; “comer na escada” abandona a pressa do trabalhador para o duplo sentido; “sentar numa boneca” deixa o gesto infantil e ganha conotação adulta; “Roberta era nome de mulher” cutuca debates de gênero e identidade. O refrão reforça a tese: “Hoje em dia alhos são bugalhos / Coringa é carta fora do baralho” e “A mão agora entrou na contramão de Eva e Adão” ironizam regras invertidas, sem moralismo. Assinada por dois autores prolíficos dos anos 80, a canção vira crônica popular das viradas semânticas e dos costumes, amplificada nacionalmente pelo Domingão.