0 É Par(do) (part. Youngui)

Identidade e resistência em “0 É Par(do)” de Nle Dopre

O título “0 É Par(do) (part. Youngui)” traz um jogo de palavras que une matemática e identidade racial. Ao afirmar que o zero é par e, ao mesmo tempo, "pardo", Nle Dopre sugere a condição de quem não pertence a extremos, mas carrega múltiplas identidades. O verso “Power Ranger pardo” reforça essa ideia, usando a imagem dos personagens coloridos para falar sobre pertencimento e a busca por um lugar próprio, especialmente para quem cresce em ambientes marcados pela diversidade racial e social. O artista destaca que "morfou sozinho", indicando que precisou se reinventar e encontrar força em sua própria multiplicidade, sem depender de aceitação externa.

A ambientação em “Guarulhos, Iraque” aproxima a realidade da periferia brasileira de zonas de conflito, ressaltando a dureza do cotidiano e a luta pela sobrevivência. Expressões como “onde você aprende a engatinhar em caco de vidro” e “onde matar a sua fome é assinar um homicídio” ilustram a violência estrutural e as dificuldades enfrentadas por quem vive à margem. Ao citar “Artigo 155, acabei de roubar a cena no grito”, Nle Dopre mistura o código penal do furto com a ideia de conquistar espaço à força. A repetição de “eu ando todo de preto igual a porra do MIB” faz referência ao visual dos Homens de Preto, simbolizando resistência e prontidão diante de um mundo hostil.

Ao longo da música, o artista mistura orgulho e crítica social, abordando racismo, autoafirmação e superação. O trecho “No passado era tipo: Ah, seu cabelo é feio! / Sempre o mesmo corte, a mesma cara, o mesmo jeito / Não fiquei bonito, fia, só tô com meu bolso cheio” mostra a transformação do preconceito em autoconfiança. Nle Dopre se assume como anti-herói, alguém que não busca ser exemplo, mas desafia padrões e propõe mudanças, usando o microfone como arma (“artigo 157”) e a música como instrumento de denúncia e afirmação coletiva.