Pior Do Que Parece

Fachada e desabafo no pulso de “Pior Do Que Parece”

O refrão se contradiz de propósito: “tá tudo tão bem” e “pior do que parece” funcionam como fachada e vazamento, mostrando o que escapa quando a pose de normalidade falha. O som acompanha a ideia: instrumental mais pesado com vozes suaves, reforçando a ambivalência e a estética plural do O Grilo (rock, MPB, indie). Lançada em 22/08/2024 como parte da segunda etapa de TUDO ACONTECE AGORA, a faixa nasceu de um riff de Felipe Martins em ensaio, o que ajuda a explicar a fluidez direta da letra, como um pensamento que oscila entre esperança e desalento.

A narrativa parte do esgotamento da rotina: “Talvez o dia a dia já não me deixe enxergar / O mundo como um lugar”, condensado no oxímoro “Feliz, melancolia”. Daí a imagem extrema de “quando o Sol explodir” se misturar com cenas banais — “num jogo do Corinthians”, “num jantar”, “na ponta da cadeira segundos antes do filme acabar”. O cotidiano vira metáfora: mesmo nos prazeres simples, ronda a ansiedade sobre finitude e a fragilidade da alegria. O pêndulo emocional aparece no vai e vem de “pior do que parece” e “melhor do que parece”, e no par “Estou, mas não queria estar” versus “Estou, bem que eu queria estar”. É uma ironia seca: socialmente diz-se “tá tudo bem”, por baixo há desalinho. A referência popular e paulista ancora a melancolia na “brasilidade” da banda, aproximando a crise e deixando a canção entre a resignação lúcida e o desejo teimoso de que ainda possa ficar melhor.