Montagem

“Montagem”: ostentação fake e o chamado à verdade

Em “Montagem”, Samba KF vira o jogo da ostentação: em vez de se exibir, confessa “Tudo que vês aqui é montagem”. O narrador fala com quem acompanha suas redes e com a galera da noite, explicando que o que dá engajamento são bebidas e shisha, enquanto o trabalho quase não aparece: “Eu trabalho ninguém vê / Se posto bebida... assim queres me ver”. “Montagem” opera em dois planos: a edição e a pose nas redes, e a encenação de status fora delas. A crítica se concretiza em versos que mostram o custo da farsa: “Sustenta bu vício fidjo passa fome” (sustenta teu vício, teu filho passa fome) e “Se bu debi bu cá paga bu ostenta na noite” (se você tem dívida, você não paga; ostenta na noite). O fake do dia a dia também é exposto: “Ku roupa emprestado ta fazi montagem” (com roupa emprestada faz montagem) e “A garrafa na mesa também é montagem”.

A voz é a de um trabalhador frustrado, cansado dos “sangue sugas da noite”, que decide cortar laços e priorizar o essencial. O refrão “Es é txeu ki ta vive mal fazi montagem ta vivi bem” (muitos vivem mal, fazem montagem para parecer que vivem bem) vira um mantra, enquanto o “No bai” (vamos) convoca uma mudança coletiva. A repetição funciona como o “replay” do feed: expõe a farsa, mostra as consequências e lembra que pose não paga conta nem alimenta filho. Fiel à pegada motivadora do artista guineense que ganhou força mundial a partir de 2022, Samba KF não só denuncia; ele convida à responsabilidade e à autenticidade.