Espelunca

Humor e caos em “Espelunca”: armadilhas e refrão negado

“Espelunca” se arma como a própria armadilha que descreve: promete um refrão, corta, nega e repete a piada, uma “arapuca” estrutural alinhada ao tema de bombas e pegadinhas. O título recupera “spelunca” (caverna) e o uso hispânico de gruta sombria, convertendo o cenário num buraco sujo onde se escondem explosivos e trocadilhos. N11ne, Samuel/“أخبار صموئيل” (notícias de Samuel), Bhor Habill e TonyKill montam um esquete de “investigadores de bombas”, com versos como “Investigando bombas malucas / Eu armei uma bomba nessa espelunca”. O próprio formato vira alvo: interrupções, entradas fora de tempo e a metalinguagem de “faz o refrão dropar” sabotam o payoff.

O humor é calculadamente tosco e provocativo. N11ne espalha “armadilhas” e “minas” no duplo sentido (artefato e mulher); “bombas” viram “bombadas” sexuais; “explosão de sabores” cola terrorismo em marketing de comida (“esfirra quente”). A rota salta para a Arábia Saudita com estereótipos (burca, “quarenta virgens”), enquanto o “11” de N11ne e a menção às “duas torres” evocam 11/9 por hipérbole grotesca (“novecentos andares”), mirando o choque e o pânico midiático. Referências pop como “Chris Tucker e Jackie Chan” e “pique Marrone” misturam cinema de ação e sertanejo numa colagem nonsense. No fim, a “espelunca” é o ambiente e o método: lugar barulhento e barato onde o SPG encena masculinidade fanfarrona e cultura de armadilha, rindo do próprio rap com um refrão que nunca chega. No álbum “Baguncinhas no Mediterrâneo” (2025), é a bagunça levada ao limite: geografia confusa, trocadilho como arma e um porão de tabus detonado por piada, não por tese.