HOMEM AREIA

“HOMEM AREIA” e a máscara de vilão e frustração doméstica

Mais do que uma paródia nerd, “HOMEM AREIA”, de SPG, encena um sujeito que veste a máscara de “vilão” para despejar frustrações e desejos tortos. A figura do homem-areia funciona como metáfora de alguém que se desfaz e se recompõe: mistura obra de pedreiro, caçamba de areia e o vilão da Marvel para inflar força e, ao mesmo tempo, expor ruína. O universo do Homem-Aranha é parodiado ponto a ponto: “Saudades do tio Ben” aciona o trauma clássico; Gwen Stacy vira piada de duplo sentido com “soltei uma teia...”, em que “teia” cruza o limite entre poder e conotação sexual; a citação a “Spider-Gwen” chama a versão alternativa dos quadrinhos. Até J. Jonah Jameson vira fetiche debochado, enquanto “Peter Parkinson adquirido na masturbação” faz trocadilho com o nome do herói e com tremor. A menção à Mary Jane morrer por conta do herói ecoa a polêmica de Spider-Man: Reign, em que a intimidade com Peter traz consequências radioativas, aqui usada para choque e humor negro. No meio, a cultura pop banal vira munição cômica — Hot Wheels, rottweilers com nomes de pessoa, pastel de feira e caldo de cana — costurada por gírias e o escracho típico da web.

Por trás do caos, há um fio narrativo: o eu lírico se assume “vilão” e hipertrofia o corpo (levanta prédio no braço, vira carro, tem “dois de tudo”) para compensar humilhação doméstica — “Minha esposa me transformou no vilão”, com traição e doenças citadas nominalmente — e carência travestida de bravata. O exagero físico e sexual, o nonsense e a autoparódia montam uma persona que ri de si enquanto cutuca o ouvinte pelo choque. Deboche e autoironia andam juntos: entre o desejo por figuras do universo do Aranha e a pose agressiva, transparecem frustração, insegurança e vontade de atenção. O efeito é de risada desconfortável: um carnaval de referências e hipérboles que usa a fantasia de vilão da Marvel para encobrir — sem esconder de todo — a fragilidade de quem fala.