Lecker

“Lecker” como compulsão: apetite, poder e busca por amparo

Por trás do cardápio explícito de lamber e sugar, “Lecker” expõe uma carência de amparo. A linha “Ich brauch’ etwas zum Festhalten” (eu preciso de algo para me segurar) é o eixo emocional escondido sob gordura e loção. No curta “NSL”, em que o clipe aparece ao lado de “Nass” e “Schweiss”, o urso e o séquito de mulheres viram caricaturas de apetite e poder, empurrando a letra para a sátira física típica de Till Lindemann. O refrão em mantra — “Ich lutsch das auf / ich leck das ab / leck-leck-lecker” (eu chupo isso até o fim / eu lambo isso / delícia-delícia-delícia) — impõe um ritmo compulsivo, entre fome e desejo, até quase um transe. A repetição reforça a ideia de consumo infinito: o ato pode ser literal (comida, gordura, manteiga) e sexual, costurando prazer sensorial e humor sombrio. Versos como “Ein großes Herz in breiter Brust / Die Seele unter weiten Falten” (um grande coração no peito largo / a alma sob dobras amplas) misturam afeto, volume corporal e fetiche.

As imagens táteis dão o tom: “Es reibe sich mit der Lotion ein” (esfregue-se com a loção), “Fett wie ein Schwein” (gordo como um porco), “Die Bauchhaut glänzt im Sonnenschein” (a pele da barriga brilha ao sol). Loção e manteiga transformam a pele em superfície brilhante, quase culinária: o corpo vira prato e o apetite vira ritual. Dentro do álbum “Zunge”, “Lecker” mantém o duplo sentido de Lindemann — um hedonismo de consumo que encena gula e sexo enquanto confessa a necessidade primária de conforto e controle. O contraste entre o refrão prazeroso e a busca por algo para segurar amarra o tema central: quanto mais se lambe e se suga, mais se tenta preencher um vazio que não é só físico.