Tablet

“Tablet” entre dor, lucidez e o impulso de liberdade

Em “Tablet”, de TOOBOE, a pílula não anestesia: corrói. O título em japonês, 錠剤 (pílula), vira o gesto de engolir uma verdade ácida que se infiltra no corpo, como em “赤く溶け込んだ 常在” (presença constante dissolvida em vermelho). O cenário urbano é áspero: “電線の絡まる摩天楼” (arranha-céus enroscados em fios elétricos), julgamento e consumo em “見くだされて 食べられて” (desprezado e devorado), a “ヴィーナス” (Vênus) quebrada que ri e “悪魔が踊る” (o demônio dança). Quando “善悪すら通じない” (nem o bem e o mal fazem sentido), TOOBOE critica a moralidade torcida e o comportamento humano. Essa ambiguidade combina com o universo de Chainsaw Man, onde violência e lucidez andam juntas e o sangue quase perfuma o real.

O arco emocional é queda e vertigem: “愛に優って 落ちてゆく/ただそれでも 心は浮ついてる” (acima do amor, vou caindo/ainda assim, o coração fica leve). Há atração pelo risco em “衝動的で 少し飛び出た あなたが綺麗で” (você, impulsivo e um pouco fora da linha, é lindo) e consciência do fim da juventude em “暮れなずんで行く 刹那の青春” (a juventude fugaz que vai escurecendo). O tédio corrói — “退屈しのぎばっか” (só para matar o tédio) — até o impacto de “真夜中に泣いた銃声” (um tiro chorou à meia-noite), que perfura a dormência e faz sentir-se vivo, seja literal, seja psíquico.

Daí nasce o desejo de ruptura: “支配を突破って 自由になろうぜ” (vamos romper o domínio e ser livres), sem desistir de afeto: “また凍りもせず 愛を探している” (sem voltar a congelar, estou procurando o amor). “水面の悪魔” (o demônio à flor d’água) é a própria sombra a encarar. Gestos simples — ir ao cinema amanhã e desejar “あなたの幸せ” (sua felicidade) — funcionam como antídotos ao escape químico. A canção vibra entre a pílula como fuga que alimenta excessos e como remédio amargo que desperta para escolher a liberdade.