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Os Índios da Meia Praia

Zeca Afonso

LetraSignificado

    Aldeia da Meia-Praia
    Ali mesmo ao pé de Lagos
    Vou fazer-te uma cantiga
    Da melhor que sei e faço
    De Monte-Gordo vieram
    Alguns por seu próprio pé
    Um chegou de bicicleta
    Outro foi de marcha a ré
    Houve até quem estendesse
    A mão a mãe caridade
    Para comprar um bilhete
    De paragem para a cidade

    Oh, mar, que tanto forcejas
    Pescador de peixe ingrato
    Trabalhaste noite e dia
    Para ganhares um pataco
    Quando os teus olhos tropeçam
    No voo duma gaivota
    Em vez de peixe vê peças
    De ouro caindo na lota

    Quem aqui vier morar
    Não traga mesa nem cama
    Com sete palmos de terra
    Se constrói uma cabana
    Uma cabana de colmo
    E viva a comunidade

    Quando a gente está unida
    Tudo se faz de vontade
    Tudo se faz de vontade

    Mas não chega a nossa voz
    Só do mar tem o proveito
    Quem se aproveita de nós
    Tu trabalhas todo o ano
    Na lota deixam-te mudo
    Chupam-te até ao tutano
    Chupam-te o couro cab'ludo
    Quem dera que a gente tenha
    De Agostinho a valentia
    Para alimentar a sanha

    De esganar a burguesia
    Diz o amigo no aperto
    Pouco ganho, muita léria
    Hei-de fazer uma casa
    Feita de pau e de pedra
    Adeus disse a Monte-Gordo
    (Nada o prende ao mal passado)
    Mas nada o prende ao presente
    Se só ele é o enganado

    Foram ficando, ficando
    Quando um dia um cidadão
    Não sei nem como nem quando
    Veio à baila a habitaçao
    Mas quem tem calos no rabo
    E isto não é segredo
    É sempre desconfiado
    Poe-se atrás do arvoredo
    Oito mil horas contadas
    Laboraram a preceito
    Até que veio o primeiro

    Documento autenticado
    Veio um cheque pelo correio
    E alguns pedreiros amigos
    Disse o pescador consigo
    Só quem trabalha é honrado

    Quem aqui vier morar
    Não traga mesa nem cama
    Com sete palmos de terra
    Se constrói uma cabana
    Eram mulheres e crianças
    Cada um c'o seu tijolo

    Isto aqui era uma orquestra
    Quem diz o contrário é tolo
    E toda a gente interessada
    Colabarou a preceito
    Vamos trabalhar a eito
    Dizia a rapaziada

    Não basta pregar um prego
    Para ter um bairro novo
    Só unidos venceremos
    Reza um ditado do Povo
    E se a má língua não cessa
    Eu daqui vivo não saia
    Pois nada apaga a nobreza
    Dos índios da Meia-Praia

    Quem vê na praia o turista
    Para jogar na roleta
    Vestir a casaca preta
    Do malfrao capitalista
    Foi sempre a tua figura
    Tubarão de mil aparas
    Deixar tudo à dependura
    Quando na presa reparas
    Das eleiçoes acabadas
    Do resultado previsto
    Saiu o que tendes visto

    Muitas obras embargadas
    Mas não por vontade própria
    Porque a luta continua
    Pois é dele a sua história
    E o povo saiu à rua
    Mandadores de alta finança
    Fazem tudo andar pra trás

    Dizem que o mundo só anda
    Tendo à frente um capataz
    E toca de papelada
    No vaivém dos ministérios
    Mas hão-de fugir aos berros
    Inda a banda vai na estrada
    Eram mulheres e crianças
    Cada um c'o seu tijolo
    Isto aqui era uma orquestra
    Quem diz o contrário é tolo


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