Fificané

“Fificané”: carnaval, cana e astúcia coletiva na rua

“Fificané” funciona como senha de rua: o jeitinho e a gambiarra coletiva para “burlar lei” quando faltam festa e sustento. A faixa costura carnaval e canavial como dois lados da mesma resistência. No verso “Mai desse lado aqui só tem canavial / Usinando mé pra quem quer medicinal / Queimando tudo...”, a banda joga com o duplo sentido de queimar cana e queimar erva, ecoando seu interesse por pautas como a legalização da maconha e críticas ao poder, já vistas em “Derramaro o Gai pt. 2”. O deboche é “sagrado”: “Erguemo o gole que o santo rejeitou” afronta o moralismo religioso, enquanto “Venderam um céu / Merma esquina entortando o pincel” cutuca quem lucra vendendo milagre repetido na esquina.

O mapa de referências finca o pé na Paraíba e na mistura de ritmos que o Zepelim e o Sopro do Cão abraça. Igor Kannário e Bell Marques (axé), “Chiclete e Gonzaga na manivela” (do trio elétrico ao forró de Luiz Gonzaga) e a Micarande de Campina Grande montam o cenário, junto a bairros e cidades — “Jeré”, “Pedrega”, Sousa, Ingá, Sumé, Sapé — para um carnaval de rebeldia fora da corda dos blocos, com pogo punk sofrendo perseguição. A rua se organiza para existir livre, mesmo de Mille na banguela e sem grana, porque “Sem carnaval nem pão fificané”: quando Estado e mercado negam alegria e comida, vale a astúcia popular para sobreviver, circular e tumultuar. Fica a sensação de euforia insurgente, ironia afiada e celebração do corpo livre, misturando política, sátira e batucada pesada como “batera que pesa 1 tera”.