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Samba-enredo da Viradouro 2022 é declaração de amor ao carnaval

Analisando letras · Por Camila Fernandes

11 de Março de 2022, às 19:00

Não existe momento mais feliz que o carnaval. Por cinco dias no ano, as ruas são invadidas pela cor e pela música, e a alegria contagia o país inteiro. Essa é a mensagem trazida pelo samba-enredo da Viradouro para 2022. 

Samba-enredo Viradouro 2022
Créditos: Divulgação

Para demonstrar essa alegria, a escola de Niterói que foi campeã do carnaval carioca em 2020 apostou em uma história do passado: o carnaval da euforia, o maior carnaval de todos os tempos — foi assim que ficou conhecido o carnaval de 1919, primeiro depois da pandemia da Gripe Espanhola.

Com muita animação, várias referências e rimas ricas, o samba-enredo da Viradouro promete conquistar o coração dos amantes do carnaval. Se depender da escola, a festa na avenida vai ser garantida. 

Aumenta o som e vem com a gente conferir a análise do samba-enredo da Viradouro para o carnaval 2022!

Análise do samba-enredo da Viradouro 2022

Com composição de Ademir Ribeiro, Devid Gonçalves, Fábio Borges, Felipe Filósofo, Lucas Marques e Porkinho, e interpretação de Zé Paulo Sierra, o samba eleito para o desfile da Viradouro em 2022 recebeu o título de Não Há Tristeza Que Possa Suportar Tanta Alegria

O título é referência a um trecho de uma canção de baile do pré-carnaval de 1919, do Clube dos Democráticos, clube carnavalesco mais antigo do Brasil ainda em atividade. E é justamente para 1919 que o enredo da Viradouro pretende nos levar. 

Em 2022, a escola vai destacar o sentimento dos cariocas na folia de 1919, que marcou a superação da pandemia da Gripe Espanhola e ficou conhecida como “o maior carnaval de todos os tempos”.

Hoje, enquanto o mundo vive a pandemia da Covid-19, na esperança do retorno dos carnavais, a Viradouro quis resgatar essa história para mostrar que a superação é possível, e que a alegria carnavalesca pode desbancar qualquer tristeza, por maior que ela seja.

Formato inédito: uma carta de Pierrot

A Viradouro é conhecida por inovar nos gêneros textuais na composição do samba-enredo, e neste ano não foi diferente. A escola apostou em uma carta, formato que aparece pela primeira vez no carnaval carioca

A carta é assinada por um Pierrot Apaixonado, inspirada no tradicional personagem dos carnavais e na marchinha homônima composta por Noel Rosa em 1935.

Análise da letra do samba-enredo da Viradouro 2022

Para entender a letra, precisamos entender o personagem que ela traz. Pierrot, que assina a carta, é um personagem da Commedia dell’Arte, estilo de teatro popular italiano. Na história original, Pierrot é o padeiro da corte, apaixonado por Colombina. Só que Colombina é apaixonada por outro personagem, o Arlequim. 

Commedia DellArte
Créditos: Divulgação

Você já ouviu esses  nomes em algum lugar, não é? Esses três papéis se tornaram famosos no mundo inteiro, e viraram as fantasias mais usadas nos primórdios do carnaval brasileiro. O samba da Viradouro é uma carta de Pierrot para Colombina, e ao mesmo tempo é uma carta dos brasileiros ao carnaval

Amor, escrevi esta carta sincera

Virei noites à sua espera

Por te querer quase enlouqueci

Pintei o rosto de saudade e andei por aí

Por causa da pandemia de Gripe Espanhola que começou em 1918, várias atividades públicas precisaram ser canceladas para evitar a transmissão da doença.

Por isso, em 1919 os brasileiros esperavam apreensivos e ao mesmo tempo ansiosos pelo carnaval, sem saber se a folia realmente aconteceria. Qualquer semelhança com a atualidade não é mera coincidência.

A primeira estrofe retrata essa apreensão, e também faz referência à máscara de Pierrot, que “pinta o rosto de saudade”. Ao contrário do Arlequim, que é um palhaço cômico e malandro, o Pierrot é retratado como um palhaço triste, melancólico, que sofre por amor — assim como os brasileiros sofriam de saudades do carnaval.

Pierrot
Créditos: Divulgação

Segui seu olhar numa luz tão linda

Conduziu meu corpo, ainda

O coração é passageiro do talvez

Alegoria ironizando a lucidez

Na segunda estrofe, vale destacar o trecho alegoria ironizando a lucidez, que chama atenção para o poder que o carnaval tem de usar as alegorias para retratar grandes questões políticas e sociais.

Senti lirismo, estado de graça

Eu fico assim quando você passa

A Avenida ganha cor, perfuma o desejo

Sozinho te ouço se ao longe te vejo

A terceira estrofe descreve o sentimento de euforia provocado pelo carnaval, que nos deixa em estado de graça. A mesma alegria de Pierrot ao ver sua amada.

Te procurei nos compassos e pude

Aos pés da cruz agradecer à saúde

Choram cordas da nostalgia

Pra eternidade, um samba nascia

O verso te procurei nos compassos é uma referência aos famosos bailes pré-carnaval, onde era possível sentir o gostinho da folia. Já o verso seguinte, aos pés da cruz agradecer à saúde, aqui traz um duplo sentido: podemos entendê-lo como agradecimento à divindade, ou à Cruz Vermelha, que foi extremamente importante no combate à Gripe Espanhola.

Baile de Carnaval
Créditos: Divulgação

Nos dois últimos versos da estrofe, a letra faz referência ao choro, estilo que é um dos precursores do samba, e também à oficialização do samba como gênero musical, que aconteceu em 1919.

Não perdi a fé, preciso te rever

Fui ao terreiro, clamei: Obaluaê!

Se afastou o mal que nos separou

Já posso sonhar nas bênçãos do tambor

Apesar de todo o sofrimento da pandemia, o brasileiro não desistiu do carnaval, assim como Pierrot nunca desistiu de sua amada.

Permanece viva a esperança de superação e de rever a festa acontecendo nas avenidas. A estrofe retrata os clamores pelo fim da gripe ao citar Obaluaê, o orixá da cura.

Amanheceu! Num instante já

Os raios de sol foram testemunhar

O desembarque do afeto vindouro

Acordes virão da Viradouro

Tirei a máscara no clima envolvente

Encostei os lábios suavemente

E te beijei na alegria sem fim

Carnaval, te amo, na vida és tudo pra mim

Finalmente, depois de todo o sofrimento, no dia 5 de março de 1919 o Rio de Janeiro foi às ruas para celebrar o amor pelo carnaval. Uma folia inesquecível, que ficou marcada na história até mesmo de quem não viveu.

O verso tirei a máscara pode ser interpretado de duas formas: a liberdade de finalmente poder tirar as máscaras que protegiam contra o vírus da gripe, ou a retirada da máscara de saudades citada no começo da música, já que o Pierrot finalmente encontra sua amada.

A última estrofe antes da assinatura da carta traz a frase mais marcante da letra, que certamente vai ecoar na voz do público quando a Viradouro passar pela avenida: Carnaval, te amo, na vida és tudo pra mim!

Assinado: um Pierrot Apaixonado

Que além do infinito o amor se renove

Rio de janeiro, 5 de março de 1919

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