Samba-Enredo 2020 - O Rei Negro do Picadeiro

“Samba-Enredo 2020 - O Rei Negro do Picadeiro” legado negro

No enredo do G.R.E.S. Acadêmicos do Salgueiro (RJ), o picadeiro vira manifesto de permanência negra — “Aqui o negro não sai de cartaz” — e bandeira de representatividade. O “nobre palhaço” é Benjamin de Oliveira e, ao mesmo tempo, “milhões de Benjamins”, ampliando a homenagem para além da biografia. A narrativa acompanha sua ascensão desde a precariedade do circo itinerante: “Na corda bamba da vida me criei” e “Do meu trapézio saltei num voo pra felicidade” traduzem risco e superação; “breque, mambembe moleque” remete à infância humilde e à estrada. “Alma de artista que vai onde o povo está” afirma a vocação popular, enquanto “Quando cair, no talento, saber levantar” resume a ética do palhaço que transforma tropeço em arte. Em “Fazer sorrir quando a tinta insiste em manchar”, a tinta é literal (a maquiagem que borra) e simbólica (o racismo que tenta macular), respondidos com humor, afeto e técnica.

O orgulho racial pulsa em “O rosto retinto exposto / Na cara da gente um nariz vermelho”, que confronta o apagamento ao exibir a pele negra sob a máscara. “num circo sem lona” sugere desamparo, mas “o show tem que continuar” reforça a resiliência. O enredo também invoca Zambi e Mutalambô, conectando Benjamin às matrizes afro-brasileiras e ao gesto de coroação em “A luta me fez majestade” e “Na pele, o tom da coragem”. Em 2020, ao celebrar os 150 anos do artista com múltiplos intérpretes na avenida — eco de “milhões de Benjamins” — o samba fixa seus eixos: resistência, pertencimento, esperança e a alegria como arma política, sintetizados no fecho: “Sorrir é resistir.”