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Conheça o significado do samba-enredo da Grande Rio, campeã do Carnaval 2022

Analisando letras · Por Ana Paula Marques

27 de Abril de 2022, às 15:00

O samba-enredo da Grande Rio 2022 foi coroado o grande campeão do Carnaval da Marquês de Sapucaí, no Rio de Janeiro, levando a escola de Duque de Caxias a seu primeiro título do Grupo Especial.

Depois de bater quatro vezes na trave e levar o vice-campeonato em 2006, 2007, 2010 e 2020, a Tricolor mostrou as facetas de Exu e soltou o grito de “é campeã” após uma disputa acirrada com a Beija-Flor de Nilópolis, com diferença final de apenas 0,3 ponto.

Desfile Grande Rio 2022
Créditos: Mauro Pimentel / AFP

Com o enredo Fala, Majeté! Sete chaves de Exu, assinado por Gabriel Haddad e Leonardo Bora, a escola prestou uma homenagem ao orixá frequentemente confundido com o demônio e mostrou que não existe espaço para intolerância religiosa.

Na avenida, a Grande Rio mostrou um dos sambas mais bonitos de sua história e não decepcionou os espectadores com a riqueza de detalhes em cada ala e elemento, do abre-alas à bateria.

Que tal conhecer um pouco mais sobre o samba-enredo e os significados do trabalho da agremiação de Caxias? Vamos lá!

Significado do samba-enredo da Grande Rio 2022

Ao compor o samba-enredo da Grande Rio, os carnavalescos Gabriel Haddad e Leonardo Bora assumiram o grande desafio de desconstruir estereótipos de intolerância religiosa com muita coragem.

Com versos carregados de simbolismo, a escola cantou sobre Exu, divindade adorada no candomblé e na umbanda, mas frequentemente confundida com um demônio, sem deixar de homenagear quem transformou lixo em arte, como Bispo do Rosário, Estamira e Stela do Patrocínio.

O ousado samba-enredo não foi fruto do acaso: a agremiação já havia cantado sobre Exu em 1993. Afinal, Duque de Caxias abriga a maior concentração de terreiros de matriz africana em todo o Rio de Janeiro.

Vamos entender melhor a letra?

A chegada de Exu

Com música de Gustavo Clarão, Arlindinho Cruz, Jr. Fragga, Claudio Mattos, Thiago Meiners e Igor Leal, o enredo começa com Exu baixando na Terra: 

Boa noite, moça, boa noite, moço

Aqui na Terra é o nosso templo de fé

No abre-alas, encruzilhadas, barcas e assentamentos contam visualmente a chegada do orixá, fazendo referência à primeira chave de Exu e à chegada dos africanos ao Brasil.

abre alas grande rio 2022
Créditos: Allan Duffes e Nelson Malfacini/ Site CARNAVALESCO

Na sequência, o samba faz menção aos negros que cruzaram oceanos sem perder sua fé, transformando o mar em dendê.

Faísca da cabaça de Igbá

Na gira, Bombogira, Aluvaiá

Num mar de dendê

Caboclo, andarilho, mensageiro

E continua, com a segunda chave do orixá: Exu simbolizado na energia de Zumbi de Palmares.

Meu povo firma ponto no terreiro

A voz de Palmares, Zumbi Àgbá

“Alimentando” Exu

O samba-enredo da Grande Rio prossegue com as oferendas preparadas para o orixá, enquanto a melodia cresce:

Prepara o padê pro meu axé

Exu Caveira, Sete Saias, Catacumba

É no toque da macumba, saravá, Alafiá

No candomblé e na umbanda, Exu é o grande guardião e primeiro orixá a comer as oferendas (ou “padê”), alimentando-se antes mesmo que o grande rei Oxalá.

exu grande rio 2022
Créditos: Divulgação

A música continua, com o tempo alterado com primor pelo mestre Fafá, incluindo paradinhas estratégicas da bateria para que o povo entoasse o enredo a plenos pulmões. 

Começam, então, menções a outras entidades e a celebração das festas.

Ô, luar, ô, luar

Catiço reinando na segunda-feira

Ô, luar, dobra o surdo de terceira

Pra saudar os guardiões da favela

Eu sou da Lira e meu bloco é sentinela

Nessa estrofe, menciona-se a segunda-feira por ser o dia de Exu, enquanto “ô luar” é um trecho do samba-enredo No Mundo da Lua, de 1993, ao som do “sete da lira e do surdo de terceira”, referências a festividades africanas.

O enredo progride para sua próxima parte, retratando Exu como um Manunaíma, herói de Mário de Andrade.

Laroyê, laroyê, laroyê

É poesia na escola ou no sertão

A voz do povo, profeta das ruas

Tantas Estamiras desse chão

A canção cita a moradora de rua e catadora de recicláveis Estamira, que sempre começa sua fala com “Fala Majeté”, elevando Exu à condição de majestade.

Estamira ficou conhecida após ser tema de um documentário homônimo, em 2004, dirigido por Marcos Prado, que retratou a luta da catadora de recicláveis com a doença mental e a importância do lixo que ela transformou em arte.

Estamira / Créditos: Divulgação

Nesse sentido, o enredo expande seu significado, pois também fala de Exu, o orixá que cuida do “lixo” da sociedade, isto é, aqueles que estão marginalizados e esquecidos.

Na Sapucaí, uma das alas da agremiação retratou o Lixão de Gramacho, maior aterro sanitário da América Latina, onde Estamira trabalhava: de acordo com os carnavalescos, uma ponte entre o enredo e a natureza humana falha.

O poder de Exu

A música prossegue com o apontamento de que Exu está em tudo e em todos, até mesmo nos anônimos:

Adakê Exu, Exu, ê Mojubá

Ê Bará ô, Elegbara

Lá na encruza, a esperança acendeu

Sou Grande Rio, Grande Rio sou eu

Até mesmo a grande vitória do samba-enredo da Grande Rio foi profetizada: 

Laroyê, laroyê, laroyê

As Sete Chaves vêm abrir meu caminhar

À meia-noite ou no Sol do alvorecer

Pra confirmar

Adakê Exu, Exu, ê Mojubá

Ê Bará ô, Elegbara

Lá na encruza, a esperança acendeu

Sou Grande Rio, Grande Rio sou eu

Nessa estrofe, “Adakê Exu” significa “rei Exu”, responsável por abrir os caminhos para uma nova era, a do campeonato da escola de Caxias.

Enfim, o samba termina como começou, fazendo uma referência ao tempo cíclico de Exu, que não tem começo, meio ou fim.

Eu levo fé nesse povo que diz

Boa noite, moça, boa noite, moço

Boa noite, moça, boa noite, moço

Boa noite, moça, boa noite, moço

Quem é Exu

Grande protagonista e inspiração do samba-enredo da Grande Rio 2022, Exu é uma das divindades do candomblé e da umbanda, responsável por guardar os fiéis e abrir os caminhos da prosperidade.

No entanto, como é frequentemente retratado em roupas pretas e com um tridente em mãos, a entidade acabou erroneamente associada à maldade por pessoas que não conhecem as religiões de matriz africana.

Exu é conhecido por misturar pecado e santidade, alegria e tristeza, remédio e veneno, de maneira bastante descontraída e brincalhona, quase como um paralelo aos seres humanos.

Representação de Exu no desfile da Grande Rio / Créditos: Divulgação

Orixá da comunicação (daí “Laroyê, Exu”, ou “salve, mensageiro”), Exu é também frequentemente associado a festas, artes e ao Carnaval, além de proteger aqueles que estão à margem da sociedade, o “lixo” que ninguém quer, também mencionado no enredo.

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