Saiba o que foi o movimento manguebeat, que completa 30 anos

Em 1991, surgiu em Recife o movimento contracultural que apresentou ao país um dos estilos musicais brasileiros mais inovadores: o manguebeat. Fundado por Chico Science, Fred Zero Quatro, Renato L, Mabuse e Hélder Aragão, o objetivo era renovar a cena artística de Pernambuco.

Musicalmente, a proposta do manguebeat era misturar ritmos tradicionais, como o maracatu rural e o coco, com estilos populares, principalmente o rock, o hip hop, o funk americano e as batidas eletrônicas.

Já o discurso trazia uma forte crítica social, denunciando a desigualdade social de Recife, o abandono do mangue e o descaso do Estado com o Nordeste. Como símbolo, o movimento adotou a figura do caranguejo, animal típico dos manguezais.

Vem saber mais sobre o que foi o movimento manguebeat, como surgiu e o legado que deixou para a música e a cultura brasileira.

A história do movimento manguebeat

O embrião do que viria a ser o movimento manguebeat se deu a partir de um encontro que seria decisivo entre Chico Science e o bloco baiano Lamento Negro, que tocava afoxé, samba-reggae e percussão afrobrasileira. 

Após assistir a um ensaio, Science planejou uma apresentação que reunisse o bloco e sua banda na época, a Loustal. Como ambos vinham de áreas de manguezal, o músico começou a divulgar a experiência com a frase a maior lama, o maior mangue!

Ainda assim, Science não ficou muito satisfeito com o resultado: no lugar da levada do samba-reggae, ele queria algo mais pernambucano, como o timbre da alfaia do maracatu. Coube a Maureliano Ribeiro da Silva, mestre do Lamento Negro, criar a fórmula para alcançar o som que o músico queria.

Resolvida a questão da sonoridade, foi necessário selecionar alguns integrantes do Lamento Negro para tocarem com a Loustal, o que resultou na criação da banda Chico Science & Nação Zumbi.

O encontro entre Chico Science e Fred Zero Quatro

Enquanto Chico Science fazia suas experimentações artísticas, Fred Rodrigues Montenegro, mais conhecido como Fred Zero Quatro, editava o jornal universitário Gueto, voltado para a cena cultural da periferia de Recife.

Em 1986, Zero Quatro foi cobrir uma roda de break, e conheceu Science. Mais tarde, no início dos anos 90, eles organizaram juntos o festival Viagem ao Centro do Mangue, que agradou ao público jovem.

Inspirado pela agitação cultural que estavam criando, o líder da Mundo Livre S/A decidiu redigir o release-manifesto que apresentou oficialmente o movimento manguebeat para todo o Brasil.

O manifesto Caranguejos Com Cérebro

Escrito em julho de 1992, o manifesto Caranguejos com Cérebro denunciava a miséria e o caos instalados na cidade de Recife, que estava morrendo de infarto e propunha uma renovação cultural que unisse o tradicional ao moderno. Leia um trecho:

Em meados de 91, começou a ser gerado e articulado em vários pontos da cidade um núcleo de pesquisa e produção de ideias pop. O objetivo era engendrar um *circuito energético*, capaz de conectar as boas vibrações dos mangues com a rede mundial de circulação de conceitos pop. Imagem símbolo: uma antena parabólica enfiada na lama.

A antena parabólica enfiada na lama simboliza a ideia por trás do movimento: trazer para a cena cultural da capital pernambucana referências da cultura pop e emitir para o mundo o resultado das suas criações artísticas.

A imagem também mostra a contradição social presente na cidade, em que as inovações tecnológicas conviviam lado a lado com a pobreza. 

Dois meses depois do manifesto ser enviado à imprensa, uma equipe da MTV Brasil gravou uma matéria com os artistas do manguebeat, mostrando imagens da Nação Zumbi e do Mundo Livre S/A. 

Mas foi apenas em janeiro de 1993 que o vídeo finalmente foi ao ar, durante o intervalo da transmissão exclusiva do show do Nirvana no Hollywood Rock. E assim, o movimento manguebeat conquistou o restante do país.

A origem do nome manguebeat

Muita gente não sabe, mas o termo original era manguebit. A palavra apareceu pela primeira vez como título da música Manguebit, presente no álbum Samba Esquema Noise, do Mundo Livre S/A. 

O conceito era unir o mangue ao bit da linguagem tecnológica, estética muito presente nas manifestações artísticas da cena, que também tinha o Afrofuturismo como influência.

No entanto, a imprensa acabou popularizando o nome manguebeat, que transmite a ideia de fusão entre os ritmos tradicionais de Pernambuco e a batida eletrônica. 

Sucesso de crítica e fracasso comercial

A consagração dos artistas do manguebeat no cenário nacional aconteceu em 1994 com o lançamento de dois álbuns fundamentais: Da Lama Ao Caos, de Chico Science & Nação Zumbi, e o já citado Samba Esquema Noise, do Mundo Livre S/A.

Na época, o Brasil enfrentava uma grande desigualdade social e Recife vivia uma estagnação cultural, resquício do Movimento Armorial. Liderado por Ariano Suassuna, o movimento defendia a preservação da cultura nordestina sem interferências da cultura de massa.

Embora o contexto fosse favorável para o surgimento de novas manifestações culturais, o sucesso do manguebeat foi comercialmente modesto. Isso porque a indústria musical estava mais interessada em investir nos filões do pagode e do axé.

Ainda assim, artistas como Sheik Tosado, Mestre Ambrósio, Otto, Eddie, DJ Dolores, Comadre Fulozinha, Via Sat, Querosene Jacaré e Jorge Cabeleira e O Dia Em Que Seremos Todos Inúteis conseguiram algum destaque.

As principais canções do movimento manguebeat

Confira algumas músicas que ajudaram a popularizar o movimento:

• A Praieira — Chico Science & Nação Zumbi
• Samba Makossa — Chico Science & Nação Zumbi
• Manguetown — Chico Science & Nação Zumbi
• Maracatu Atômico — Chico Science & Nação Zumbi
• Pontes, Rios e Overdrives — Chico Science & Nação Zumbi
• Samba Esquema Noise — Mundo Livre S/A
• Carnaval na Obra — Mundo Livre S/A
• A Cidade — Mundo Livre S/A
• Repente Envenenado — Sheik Tosado
• Pé de Calçada — Mestre Ambrósio

O legado de Chico Science

No dia 2 de fevereiro de 1997 o manguebeat perdeu o seu maior ícone. Chico Science dirigia na rodovia PE-001, no trecho entre Recife e Olinda, quando seu carro chocou-se contra um poste. O músico faleceu aos 30 anos de idade.

Embora o acontecimento tenha sido trágico, o movimento se fortaleceu. Science passou a ser reconhecido como um dos mais influentes artistas brasileiros, cuja obra permitiu que uma nova cena musical se desenvolvesse em Recife e se espalhasse pelo país.

Nomes como Mombojó, Siba e a Orquestra Contemporânea de Olinda e a própria Nação Zumbi, agora liderada por Jorge dü Peixe, são alguns dos artistas que continuam na trilha traçada pelo manguebeat, mantendo seu legado mais vivo do que nunca.

Frases de Chico Science

Agora que você sabe mais sobre o movimento manguebeat, aproveita e vem conferir as melhores frases de Chico Science para se inspirar e compartilhar!

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